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16 de abril de 2024 | 6:44
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Arte e Ciência: Pátrias Possíveis, Sal da Terra

O ano de 2017 caminha para o fim. Estamos a menos de três meses do Natal. E a sensação que se relata, de modo geral, é de cansaço… extremo cansaço. Nos últimos meses, uma sequência de altos e baixos fustigou não só os cidadãos brasileiros, como os de todo o mundo. Desentendimentos motivados por intolerância econômica, política, racial, religiosa e educacional explodiram nos quatro quadrantes do planeta. Não bastando, falta de água e de alimentos, incêndios e desmatamentos intencionais avizinharam-se do ressurgimento de doenças já banidas, há tempos, da sociedade. E, num horizonte de desvios de verbas e de crescente desonestidade governamental, tão abundantes nos noticiários que o povo, enojado, já desliga aparelhos de comunicação, recusando-se a adoecer do pessimismo emanado por tal rotina, candidatos a donos do mundo expuseram suas mesquinharias, expulsando multidões de pessoas e promovendo a extinção de outro tanto de etnias. Dias amargos. Tempos difíceis.

Por sua vez, um novo cenário também se redesenhou: nas ruas, ambulantes se multiplicaram. No comércio, enquanto lojas de grandes departamentos cerraram as portas, outras, menores, mais humildes, retornaram. Os vendedores de porta a porta redescobriram os bairros e as campainhas. Nas esquinas, de pães a queijos, de goiabas a jabuticabas, passando por mangas, tomates, laranjas e morangos, voltaram a ser ofertados. Pais e mães de família, desempregados, retomaram o oferecimento de seus préstimos: uma pintura de paredes, uma limpeza de calhas, uma poda de árvores, um passeio com cachorros, uma braçada de roupas para serem lavadas e passadas, entre outros. Cortes de cabelo, tratamento de mãos e pés, desentupimento de canos, venda de hortaliças e faxinas semanais multiplicaram-se. Cidadãos, estes, sem medo de trabalho. Trabalhos, estes, sem preconceito de cidadãos, e sempre necessários.

Neste cenário, o que dizer da literatura, da ficção, do imaginário? Estariam estes, a exemplo dos anteriores, encontrando meios de fugir ao esmorecimento? Seriam ainda capazes de oferecer um mundo melhor aos que os buscam e os assistem? Ocupariam, ainda, um lugar na sociedade? Certamente que sim. Tem sido próprio das Artes, em geral, sobreviverem em tempos de radicalismos difíceis, de ódio entre ideologias diferentes e de fragilização da democracia. De Homero aos dias de hoje, é o intelectual e o artista que se debruçam sobre a realidade e as contingências humanas para delas extraírem reflexões que se transformam em ensaios e poesia. O que comungam, nestas ocasiões? A liberdade de pensamento e de expressão. Ambas, distante de se resumirem a, apenas, aspectos sociais e políticos, são, acima de tudo, humanitárias. E alimentando a humanidade sobre a percepção de sutilezas, identificam-se com o sentimento das coisas e dos homens.

Neste contexto, os próprios meios de comunicação se revisam, reinventando-se. Séries, se, por um lado, insistem em apresentar a rotina estressante dos mais diversos profissionais em grandes centros, não deixam, por outro, de nos fazer comungar com os desenhos animados e as novelas de época ou cotidianas. Nestas últimas, ao passo que se apresentam os erros humanos, também se revelam as circunstâncias e motivos que geraram o ocorrido, reensinando a sociedade do fator demasiado humano que habita dentro de cada ser. Já nas primeiras, não sucumbindo aos abismos das redes sociais, e dos modismos, reapresentam o cotidiano comum de pessoas também comuns, nele pontuando o que são os valores, os sentimentos, a família e as vaidades e verdades eternas.
A que vem tudo isso? Vem para reafirmar que, mesmo nestes tempos difíceis, é a Arte, em todas as suas manifestações, a Pátria possível dentro de cada um de nós. Em sua calmaria, abriga a Humanidade, protegendo-a, e preservando-a, das atrocidades do mundo. Preservando um bem-estar só sentido, por certo, em contextos de calmaria. A Arte é a Pátria que preserva a humanidade, e integridade, do Homem. E que o alimenta de esperança, resiliência e alegria para continuar resistindo. A Arte é a Pátria da sobrevivência humana. Sobrevivência, esta, tanto física, quanto espiritual. Retire-se a Arte e o mundo será tomado de feras. A Ciência também é uma Arte. Experimental e baseada em outros princípios, por certo, mas sempre voltada, em seus princípios básicos, ao conhecimento e engrandecimento humanos. Tomadas em conjunto, são o Sal da Terra. Preservá-las é preciso.

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