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28 de março de 2024 | 9:05
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Cartografia e Literatura: a lição Islâmica

Já no século IX, os árabes cultivavam um conhecimento geográfico e astro­nômico livre de simbologias, antecipando o rigor cartográfico que estaria por vir. Sensíveis culturalmente graças às traduções em língua árabe dos grandes filósofos e cientistas gregos, os árabes, ao preservarem a Geographia, de Ptolo­meu, do incêndio que destruiu a biblioteca de Alexandria em 641, estudaram os apontamentos deste buscando generalizar seu conteúdo para outras áreas como, por exemplo, para a teoria dos climas. No caso islâmico, por exemplo, os cartogra­mas foram elaborados tanto a partir de suas campanhas militares quanto de suas peregrinações a Meca, como prescritas no Alcorão. Neste último caso, revestindo a geografia de um fundamento religioso pelo fato desta viabilizar o cumprimento dos prefeitos de seu Profeta.

No reinado do califa Al-Mamun (786-833), foi criado um observatório astro­nômico em Bagdá, com a seleção de uma equipe de experts e outros tradutores sírios que, juntos, foram encarregados de adquirir manuscritos gregos em Bizân­cio para editá-los posteriormente, neles ensinando como se elaboravam mapas. Mais tarde, sua aproximação junto à cultura europeia, que preservara as especu­lações de Aristóteles nas versões espanholas de Averróis realizadas no século XII, permitiu-lhes receber influência direta da literatura geográfica cristã romana.

A partir dos 900, mapas de elevado valor artístico passaram a ilustrar os gran­des tratados do Islã, passível de ser verificado, por exemplo, no Livro das Estradas e Províncias, de Ibn Khurdadbah (826-912). Outras obras? O Livro dos Climas, do cientista persa Istakjri, modificado por Ibn Haukal em 976 para dar origem à obra Itinerários e Províncias, instaurando, junto aos historiadores, a crença de um mapa universal ter sido utilizado nas escolas da época. No século XII, o gran­de acontecimento da cartografia islâmica: o califa El-Edrici, árabe de formação euro-islamítica que havia estudado na Universidade de Córdova, auxiliados pelo príncipe normando da Sicília, Rogério Guiscardo, preocupados em fazer avançar o conhecimento do mundo, reuniram viajantes, geógrafos e cientistas que, em trabalho conjunto, buscaram elaborar uma versão gráfica rigorosa dos dados for­necidos por marinheiros e eruditos. O resultado? O porto marítimo de Palermo tornava-se uma nova Alexandria.

Compilando, por quinze anos, os conhecimentos geográficos da época, El-E­drici e sua equipe escreveram a obra O Livro de Rogério: Recreio de quem quer andar pela Terra, a qual trazia, como anexo, o mapa universal intitulado Tábua Rogeriana. A esta obra seguindo-se outras, do mesmo autor: Os Jardins da Hu­manidade, bem como, O Recreio do Espírito, ambos também acompanhados de mapas organizados em forma de Atlas, “seguindo os esquemas zonais e climáticos da antiguidade clássica.

Trata-se, portanto, segundo historiadores, da expressão de um novo espírito, adiantado se comparado aos mapas monásticos tanto na nitidez e qualidade dos desenhos quanto no rigor de seu conteúdo geográfico, cuja fama chegou até a Renascença, apesar de sua linha se distanciar da de Ptolomeu, o qual El-Edrici provavelmente não conheceu. Entretanto, a visão medieval do mundo cristão transcendeu também aos copistas árabes mais recentes, tal como atesta o mapa circular do geógrafo Ibn-Said, morto em 1274.

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