Adalberto Luque
Julho de 1997. Paulinho evoluía nos treinamentos e começava a ter bons resultados nas provas de triatlo. Aos 17 anos ele havia disputado, em março daquele ano, sua primeira prova internacional, em Londres, na Inglaterra, na categoria Sprint, que consistia numa prova com 750 metros de natação, 20 km de bicicleta e 5 km de corrida de rua. Ele chegou entre os 200 primeiros o que, para sua faixa etária, era considerado um grande resultado. Disputou ao lado dos melhores do planeta na ocasião. Sua rotina de treinos era diária. Ele mora em Mairiporã e treinava em Atibaia. Naquela quinta-feira, 17 de julho, ele saiu de casa atrasado. Estava próximo a uma passarela, mas resolveu ganhar tempo, atravessando a Rodovia Fernão Dias para apanhar o ônibus que passava na pista oposta. Foi atropelado por um carro. O dia não tinha amanhecido e a visibilidade não ajudava. Além de estar escuro por volta de 05h15, ainda havia neblina.
Foi acordar de um coma quase 20 dias depois. Passou por diversas cirurgias, perdeu parcialmente a visão e a audição e descobriu que dera adeus à chance de chegar à categoria de triatlo olímpico, em que os atletas disputam provas com 1,5 km de natação, 40 km de bicicleta e 10 km de corrida. Paulinho estava tetraplégico.
Hoje, para viver, depende da família que não quer divulgar seu nome, pois graças a um computador adaptado, sua única distração é ver as redes sociais e notícias pela internet.
“Não gostaria que ele visse isso”, diz o pai. Se tivesse atravessado a pista pela passarela, talvez perdesse o ônibus que estava por passar. Mas certamente teria grandes chances de ser um triatleta de ponta.
Reforço
O caso de Paulinho reforça um alerta divulgado pela Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp). Segundo o órgão, 10% dos atropelamentos na malha concedida ocorrem próximo às passarelas.
Estatísticas apontam que os pedestres ocupam uma parcela significativa nos casos de acidentes registrados em rodovias. Em 2021, foram registrados 639 atropelamentos de pedestres na malha concedida do Estado, sendo que 61 deles (cerca de 10%) aconteceram a cerca de 200 metros das passarelas. Diante destes números, a recomendação da Artesp é enfática: pedestre, para sua segurança, utilize as passarelas para atravessar a rodovia.
A implantação deste dispositivo de segurança faz parte das obrigações previstas nos contratos do Programa de Concessões Rodoviárias do Estado. Atualmente, as rodovias concedidas possuem 238 passarelas. Há previsão de implantação de mais 151, das quais duas estão em fase de instalação. A escolha dos locais para implantação das passarelas é feita após estudos que apontam as áreas de maior fluxo de pedestres, justamente para evitar a travessia pela faixa de rolamento, o que pode gerar não só atropelamentos como acidentes graves envolvendo também os motoristas.
Para alertar sobre a importância do uso das passarelas para travessia segura, as concessionárias paulistas fazem campanhas constantes voltadas aos pedestres.
“Os pedestres são um elo frágil no trânsito, mas há necessidade de conscientização também por este público em relação à segurança nas vias urbanas e rodovias. O uso das passarelas para fazer a travessia na rodovia é fundamental para salvar vidas, pois a velocidade na via é alta, há dificuldade em enxergar o pedestre na faixa de rolamento, especialmente à noite, e o risco de ocorrer um atropelamento é grande” enfatiza Cibele Andrade Alves, gerente de Sinalização e Segurança da Artesp.
Para atender às necessidades dos pedestres e dos ciclistas, a estrutura das passarelas tem largura e nível de inclinação dentro das diretrizes estipuladas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Algumas são equipadas até com trava-motos, acessórios que impedem que motociclistas utilizem este tipo de travessia, o que é proibido.
A 80 metros
Um atropelamento com morte ocorrido na noite de 26 de maio na região, ilustra bem o alerta da Artesp. Um homem de 42 anos morreu atropelado por um caminhão, na Rodovia Carlos Tonani (SP-333), no km 102 + 400 metros.
Segundo a Polícia Militar Rodoviária, ele tentou atravessar a pista próximo ao Distrito Industrial de Barrinha, quando foi atropelado e não resistiu aos ferimentos. A apenas 80 metros de onde o homem perdeu a vida, havia uma passarela.
Entrevias tem 17 passarelas
Uma das duas concessionárias que administram rodovias na região de Ribeirão Preto, a Entrevias cuida de uma malha viária com 299 quilômetros. Neste trecho, há 17 passarelas, duas das quais no perímetro de Ribeirão Preto – uma no Anel Viário Sul e outra na Rodovia Anhanguera, km 322.
Segundo a concessionária, de janeiro a maio deste ano a Entrevias registrou cinco atropelamentos, que resultaram em duas mortes. Quanto à instalação de novas passarelas, a Entrevias informa que isso depende de estudos para contagem de fluxo e travessia de pedestres, uma previsão contratual com a Artesp e, no momento, não há previsão de construção de novas passarelas no trecho administrado pela concessionária na região.
Além de cuidar para que as rodovias estejam sempre sinalizadas e com infraestrutura adequada, conservação e monitoramento 24 horas, a Entrevias mantém rotas de inspeção de tráfego que percorrem todo o trecho para verificar fluidez e possíveis situações adversas. “A Entrevias realiza de forma contínua ações de conscientização com a população, principalmente com moradores lindeiros às rodovias, com foco em travessia segura e condutas preventivas”, acrescenta, em nota. Durante o “Maio Amarelo” (campanha de prevenção a acidentes), a Entrevias realizou ações com pedestres e ciclistas, com entrega de material informativo e colete reflexivo.
A maior passarela e problemas na ‘estrada de Bonfim’
Outra concessionária que administra rodovias na região é a Arteris ViaPaulista, que garante realizar campanhas educativas ao longo do trecho administrado, orientando pedestres e ciclistas sobre a travessia em lugares seguros e distribuir kits de segurança, com colete X refletivo e lanternas.
De acordo com a ViaPaulista, no trecho de Ribeirão Preto foram registrados três atropelamentos com duas mortes nos primeiros cinco meses de 2022. No mesmo período do ano anterior foram apenas dois atropelamentos sem vítimas fatais.
Um dos trechos administrados pela ViaPaulista, na Rodovia José Fregonesi (conhecida como “Estrada de Bonfim”), entre Ribeirão Preto e Bonfim Paulista, tem, frequentemente, pessoas atravessando a via na região dos condomínios horizontais. Geralmente são domésticas ou diaristas que chegam de ônibus na pista oposta.
Se fossem atravessar de forma adequada, iriam estender o percurso em mais de um quilômetro, para passar no retorno por sob a rodovia. No entanto, a maioria das mulheres que chegam, acabam se arriscando atravessando a primeira pista, pulando a mureta e atravessando a segunda pista. Outra opção seria ir até Bonfim e retornar em outro ônibus, mas isso levaria tempo e custaria mais caro.
A Arteris ViaPaulista ressalta que há dois projetos em andamento para implantação de passarelas. Um no km 311+300 metros da Rodovia José Fregonesi, justamente para atender à necessidade das pessoas que chegam ao local de ônibus urbano. O outro será no km 0,700 da avenida Castelo Branco (SPA 318/330), em Ribeirão Preto, no trecho sob concessão.
Mais duas estão em análise junto à revisão ordinária do contrato de concessão, uma na Rodovia José Fregonesi (SP 328) e outra na Rodovia Antônio Machado Sant’Anna (SP 255). Atualmente a ViaPaulista administra um trecho que conta com 10 passarelas, entre elas a maior da região, no Trevão de Ribeirão Preto, com 440 metros de extensão e que passa sobre duas rodovias, a Anhanguera e a Antônio Machado Sant’Anna.