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20 de abril de 2024 | 13:07
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Política

“O brasileiro comprou o presidente pela Internet”

Ex-deputado federal e ex-ministro do Trabalho nos governos dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, Carlos Lupi esteve em Ribeirão Preto para um encontro regional do Par­tido Democrático Brasileiro (PDT) que ele preside desde 2012. A meta é fazer o partido ser protagonista em muitas cidades nas eleições municipais do próximo ano.Em entrevista ao Tribuna, ele revelou que o partido quer ter candidato a prefeito em Ribei­rão e que o nome preferido é o do vereador Lincoln Fernandes, atual presidente da Câmara de Vereadores. Sobre o governo do presidente Jair Bolsonaro afirmou que o brasileiro comprou ‘este produto pela internet’ e agora que quando foi entregue, notou que veio com defeitos e não era o que ele esperava.

Tribuna – Em 2016 nas eleições municipais o PDT teve candidatura própria para prefeito em Ribeirão Preto, o ex-vereador Ricardo Silva.
Carlos Lupi – Mas depois ele saiu do PDT e foi para ou­tro partido. Sou um contador de histórias e vou exemplificar a saída dele com uma história que minha avó contava. Quan­do eu era criança ela morava em uma dessas casinhas típi­cas de vila no Rio de Janeiro. A casa dela ficava numa ladeira, em um nível inferior ao da rua. Para chegar à rua era preciso subir uma escada muito gran­de e sempre que alguém que passava pela ladeira e cumpri­mentava minha avó ela dizia: “Vai com Deus”. Algumas vezes ela dizia essa frase com carinho e outras vezes com indignação.

Tribuna – …E isso quer dizer….
Carlos Lupi – Vou expli­car. Depois de ouvir muitas vezes ela dizendo esta frase resolvi perguntar por que para uns ela a dizia com cari­nho e, para outros, ela falava com raiva. Aí, ela me respon­deu: “Quando falo com raiva estou me referindo aos inimi­gos. Que Deus leve eles logo”. Contei essa história para di­zer: Que ele vá com Deus.

Tribuna – Mas o senhor diz “vai com Deus” com in­dignação ou com sentimen­to de afeto?
Carlos Lupi – (Risos) Ele não é inimigo, mas que vá com Deus.

Tribuna – Nas próximas eleições o PDT pretende ter candidato próprio ao Palá­cio Rio Branco?
Carlos Lupi – Pretende­mos e precisamos ter. Temos e defendemos um projeto na­cional que o nosso candidato a presidente nas eleições do ano passado, o Ciro Gomes, já mostrou para o Brasil. Quere­mos nos diferenciar e, por isso, fincamos nossas metas no de­senvolvimento do país, seja na educação, na geração de em­pregos e na geração de renda. Lutamos para o fortalecimento da indústria e na defesa da edu­cação de tempo integral. Tive o privilégio de trabalhar com o educador Darcy Ribeiro que elaborou a Lei de Diretrizes e Bases para a Educação no Bra­sil e com o ex-governador Leo­nel Brizola. Eles diziam que só a educação liberta o povo. Bus­camos essas metas, mas para construirmos 2022 temos que começar com 2020.

Tribuna – Esse projeto passa por candidaturas para prefeitos no maior número de cidades possíveis?
Carlos Lupi – Com certeza. Em Ribeirão Preto queremos viabilizar a candidatura do vereador Lincoln Fernandes. Ele é, de fato, um nome novo na política. O Bolsonaro não significa o novo. Tem 64 anos de idade e foi deputado por 28 anos. Todos seus filhos estão na vida política há anos e ele não representa o novo.

Tribuna – E em Ribeirão Preto?
Carlos Lupi – Aqui em Ri­beirão Preto, o Lincoln, um rapaz que trabalha desde os onze anos de idade, se tornou vereador e conseguiu em seu primeiro mandato ser presi­dente de uma Câmara de ve­readores, representa o novo na política. Essas conquistas mostram o poder de articula­ção dele, porque não é fácil, no primeiro mandato, conseguir ser presidente do Legislativo de uma cidade do tamanho de Ri­beirão. Além de ter quase sete­centos mil habitantes é a capital de toda uma região. Ele ainda está no charme dele, mas vou continuar insistindo para ser nosso candidato.

Tribuna – Em relação ao governo federal, o PDT é opo­sição em tempo integral?
Carlos Lupi – Somos opo­sição, mas propositiva. Por exemplo, em relação à reforma da Previdência discordamos da proposta do governo, mas apresentamos a nossa. Em to­das as propostas que o gover­no apresentar, e que formos contra, vamos mostrar a nossa posição e como faríamos aqui­lo se fossemos governo. Para resumir, no caso da reforma da Previdência quando o go­verno estabelece 40 anos de contribuição, ele está punindo o trabalhador e dificilmente alguém conseguirá se aposen­tar. Em média, segundo o Ins­tituto Brasileiro de Geografia e Estatística, para que alguém consiga estes quarenta anos de contribuição precisará tra­balhar em media 53 anos em função do tempo – intervalos – que ele fica desempregado ou trabalhar sem registro. Se uma pessoa começa a contribuir aos 18 anos de idade acabará se aposentando com 71 anos de idade. Isso significa que como a média de vida do brasileiro é 75 anos de idade, regra geral, ele ficará aposentado apenas quatro anos antes de morrer.

Tribuna – E em relação ao Judiciário, a reforma é satisfatória?
Carlos Lupi – Ela não está mexendo com o Judiciário nem com os penduricalhos existen­tes, como o auxílio dormitório. Também não mexe com quem está nas empresas públicas e ganha mais que o teto do pre­sidente da República. Tem juiz que ganha R$ 260 mil por mês com todos os penduricalhos. Pergunto: a reforma está me­xendo e acabando com estes privilégios? Não. Na verdade mexe apenas com a parte mais frágil da sociedade.

Tribuna – Em sua opinião haverá mudanças na proposta encaminhada pelo Governo?
Carlos Lupi – Com certeza. Eles não conseguirão aprová-la do jeito que está. Vai ser uma luta difícil a que estamos tra­vando, mas vamos vencer.

Tribuna – Na área edu­cacional como o senhor avalia as propostas do atu­al governo?
Carlos Lupi – Fui relator na Câmara dos Deputados da Lei de Diretrizes e Bases da Educação e acho muito ruim a proposta do governo. Eles têm uma visão policialesca e quer doutrinar as pessoas. A educação tem que ser livre e nenhuma nação do mundo foi construída com paradigma educacional de censura. A es­cola tem que ser livre e o aluno deve discutir o que quiser, des­de a droga e até sexualidade. Se ele não discutir isso na sala de aula, vai aprender onde? Na rua? A sociedade está andando para frente e a proposta educa­cional do atual governo cami­nhando para trás.

Tribuna – O senhor é do Rio de Janeiro um estado com grandes problemas na área de segurança. Facilitar que a população tenha uma arma é algo benéfico?
Carlos Lupi – O Rio é uma espécie de síntese do país e tem como característica ser muito aberto para todos os brasilei­ros. Se o combate a violência passar pelo aumento do ar­mamento estaremos perdidos, pois o cidadão de bem, que tem que trabalhar para se sustentar, não terá como comprar arma e fazer cursos e treinamentos para usá-la. Já os bandidos, regra geral, são treinados para usar armas e para roubar, assal­tar e matar. A polícia tem que ter capacidade – técnica e de recursos – para combater a cri­minalidade e vigiar, por exem­plo, as fronteiras evitando a entrada de armas aqui. Arma­mento não resolve o problema de segurança pública.

Tribuna – Qual é o maior desafio para convencer a po­pulação das teses que o se­nhor defende?
Carlos Lupi – Apostamos na inteligência do povo brasi­leiro. Costumo dizer que o Bol­sonaro foi um produto com­prado pela internet. O povo viu e comprou. Mas passada a eleição, quando o produto che­gou à casa dele, descobriu que não era o que havia comprado e que possuía defeitos. Posso estar enganado, mas as pesqui­sas que tenho visto confirmam isso. É inconcebível alguém que se diz cristão ser patroci­nador do ódio, da divisão, das armas e da violência. Que cris­tão é esse?

Tribuna – Temas nacionais como educação e segurança devem influir nas eleições municipais do ano que vem?
Carlos Lupi – Acredito que é isso que o Bolsonaro quer. Ele tem uma fábrica de supér­fluos muito grande. Enquanto ficamos discutindo a higiene do órgão sexual ele vende o Pré-Sal. Enquanto se discute se não utilizar a cadeirinha para o transporte de crianças nos veículos deve gerar multas, ele tenta passar as reformas do jei­to dele. Essa técnica de desviar o foco é americana e utilizada para criar “cortinas de fuma­ças” para desviar atenção do povo. Eu aposto na defesa da inteligência do povo brasileiro.

Tribuna – O PDT é um partido antigo e com quaren­ta anos de fundação. Como conciliar esse passado com o que hoje é chamado de “o novo jeito de fazer política?”
Carlos Lupi – O novo não está no fato de ter pouco tempo de vida. O novo é permanecer honesto e não fazer disso uma bandeira ideológica. Quem é honesto não vende, porque quem é honesto apenas o é. Você acredita que ser honesto é tirar direitos dos trabalha­dores? Não. Com certeza não é. Ser novo é defender o que defendemos como mexer no sistema financeiro e aumentar a taxação das grandes fortunas e fazer com que os bancos res­peitem a Constituição que diz que as taxas de juros devem ser de no máximo 12%. O novo está na concepção de vida e não no tempo e na idade. Você pode ter dez anos de vida e ser velho e também pode ter 75 anos de vida e ter idéias novas. O governador Leonel Brizola morreu com 82 anos de idade e era um revolucionário.

Tribuna – A política é o principal instrumento para resolver os problemas do país?
Carlos Lupi – Temos que fa­zer da política um instrumento de transformação. Quando tentam demonizar os partidos políticos e tentar fazer o povo acreditar que todos os políti­cos são bandidos estão tentan­do beneficiar o capital. Isso é a política do pão e do circo que começou na idade medieval. A diferença de lá para o Brasil é que hoje temos apenas circo e está faltando o pão.

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