Adriana Dorazi – especial para o Tribuna Ribeirão
*com informações da assessoria do Gov. de SP / USP
Pacientes de Ribeirão Preto e região que estão em tratamento contra o câncer ganharam nova esperança nesta semana quando foram entregues as obras do Centro de Terapia Avançada (Nutera) que faz parte do maior programa avançado para a doença da América Latina.
Esse centro de produção da terapia genética CAR-T Cell usa células de defesa do próprio paciente no combate ao câncer e recebeu investimento de R$ 200 milhões do governo estadual. A técnica inovadora já se mostrou altamente eficaz no tratamento de alguns tipos de câncer de sangue, como linfoma e leucemia linfoide aguda. No Brasil, o estudo vem sendo desenvolvido em parceria entre Instituto Butantan, USP e Hemocentro de Ribeirão Preto.
O programa está sob supervisão da Secretaria de Ciência, Pesquisa e Desenvolvimento em Saúde do Estado. O Nutera vai produzir a terapia de receptor quimérico de antígeno (em tradução livre da sigla em inglês), que utiliza células T para combater o câncer de sangue. A capacidade inicial de tratamento é de até 300 pacientes por ano. São 12 unidades de produção da terapia com capacidade para fazer de 25 a 30 atendimentos mensais.
Embora já seja aplicada em alguns países, a terapia celular tem como maior obstáculo o custo elevado, que pode chegar a US$ 500 mil por aplicação em cada paciente. As unidades de São Paulo (Nucel) e de Ribeirão Preto (Nutera) vão contar com estruturas que permitirão que os principais processos da nova tecnologia – produção, desenvolvimento, armazenamento e aplicação da terapia celular – sejam efetuados em solo paulista. O objetivo é reduzir ao máximo o custo em larga escala da terapia e fazer com que ela chegue ao SUS.
As instalações incluem laboratórios de controle de qualidade, salas de criopreservação, salas de produção de vírus, salas limpas de produção de células CAR-T, salas de preparo de meios e soluções e áreas destinadas ao armazenamento do produto final e dos insumos em tanques criogênicos.
Mais sobre a inovação
A terapia celular CAR-T foi desenvolvida no Centro de Terapia Celular da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP. O primeiro voluntário, que recebeu o tratamento experimental há dois anos, alcançou a remissão total de um linfoma em estágio terminal. Outros pacientes que optaram pelo tratamento também tiveram remissão.
“A terapia celular eleva o estado de São Paulo à semelhança dos principais países da Europa, Estados Unidos e China. Este tratamento, além de ser inovador e curador, com o tempo também será acessível. Trabalhamos para que todos os brasileiros, sem distinção, tenham acesso a este tratamento”, afirmou o secretário de Ciência, Pesquisa e Desenvolvimento em Saúde, David Uip.
Um estudo clínico com 30 voluntários deve ser feito ainda este ano para comprovação da eficácia e segurança do tratamento em pacientes com linfoma não-Hodgkin de células B, câncer no sangue considerado mais agressivo.
Próximos passos
Como a terapia celular ainda está em fase experimental no Brasil, os pacientes foram tratados até agora de forma compassiva – por decisão médica, quando o câncer está em estágio avançado e não há outra alternativa de terapia. Esse tipo de pesquisa ainda não influencia uma possível aprovação final do tratamento pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), mas fortalece a possibilidade de aprovação de um estudo clínico com mais voluntários.
“Essa é a evolução do tratamento do câncer, que começou ainda no século 19. Desde as cirurgias, radioterapia, quimioterapia e, mais recentemente, o aparecimento de drogas-alvo, podemos dizer que avançamos e modernizamos todo esse processo, e o resultado é a terapia com células CAR-T. Estamos falando da possibilidade de cura e baixa toxicidade de alguns tipos de câncer sanguíneos, trata-se do tratamento do futuro”, destacou Dimas Covas, presidente do Instituto Butantan e coordenador do estudo.
Como funciona
A tecnologia celular CAR-T é um tipo de imunoterapia que utiliza linfócitos T, células do sistema imune responsáveis por combater agentes patogênicos e matar células infectadas.
O tratamento consiste em retirar e isolar os linfócitos T do paciente, ativá-los, “reprogramá-los” para conseguirem identificar e combater o câncer e depois inseri-los de volta no organismo do indivíduo. Assim, as células de defesa voltam com mais força para eliminar as células tumorais. Todo o processo pode durar cerca de dois meses.
Após a coleta do sangue, a amostra passa por um processo de separação para selecionar apenas o grupo celular de interesse – ou seja, as células T. Depois, os pesquisadores aplicam, em laboratório, um reagente que estimula a ativação dessas células.
Com os linfócitos T ativados e multiplicados, eles são colocados em contato com um vetor viral de lentivírus modificado, incapaz de causar doença. O vetor contém a informação genética de um receptor que identifica e se liga ao antígeno CD-19, o mesmo presente na superfície das células tumorais de neoplasias hematológicas.
Por conter a informação genética do receptor do CD-19, o vetor faz a célula T expressá-lo em sua superfície, originando as células CAR-T que serão usadas na terapia. O produto é congelado e passa por rigorosos testes de controle de qualidade antes de ser aplicado em um processo semelhante à transfusão de sangue. De volta à corrente sanguínea, esse conjunto de células CAR-T reconhece e se liga às células do câncer, induzindo a morte celular.
Mais investimentos na saúde pública de RP
Em uma parceria inédita, a Universidade de São Paulo – USP vai investir R$ 217 milhões no Hospital das Clínicas de São Paulo e no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto. Desse total, R$ 150 milhões serão destinados à ampliação do complexo do Hospital das Clínicas, ligado à Faculdade de Medicina (FM), e R$ 67 milhões ao Hospital das Clínicas ligado à Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP).
O reitor da USP, Carlos Gilberto Carlotti Junior, ressaltou que “a parceria da USP com o HC e com o HCRP reflete o reconhecimento, pela Universidade, da complementaridade entre as atividades das instituições. Certamente, o ensino, a pesquisa e a extensão das unidades da Universidade que desenvolvem atividades nos complexos do HC e do HCRP serão realizados com maior excelência. É também importante o apoio da USP para a assistência da saúde da população do Estado de São Paulo, principalmente neste momento de pandemia”.
Segundo ele, a iniciativa faz parte de um plano de investimentos da Reitoria para a utilização dos recursos do exercício de 2022 nos anos de 2022 e 2023, em áreas estratégicas para a Universidade: aperfeiçoamento das atividades acadêmicas, projetos de sustentabilidade, apoio à permanência e pertencimento, relacionamento com a sociedade e instâncias governamentais, aperfeiçoamento da estrutura dos museus e órgãos de cultura e extensão e construção de um Distrito Tecnológico do Jaguaré. O plano foi aprovado pelo Conselho Universitário, em reunião realizada no dia 21 de junho.
Novo instituto
No Hospital das Clínicas de São Paulo, serão implantados dois novos prédios: o Centro de Pesquisas Clínicas e o Instituto Dr. Ovídio Pires de Campos, que receberão recursos da ordem de R$ 130 milhões. A ampliação do complexo com a construção dos edifícios vai aumentar a capacidade de atendimento do HC nas especialidades de oftalmologia, otorrinolaringologia, bucomaxilo, cabeça e pescoço e cirurgia plástica craniofacial.
O Instituto Dr. Ovídio Pires de Campos se juntará aos oito já existentes no complexo do HC. As obras devem ser iniciadas no primeiro trimestre de 2023, com duração prevista de 24 meses. O instituto contará com 14 salas cirúrgicas, 17 leitos de recuperação cirúrgica e outros 10 de UTI. A nova estrutura permitirá ainda aumentar em 178% a capacidade mensal de realização de cirurgias ambulatoriais, em 75% a realização de cirurgias de grande porte, que necessitam de internação, e em 47% as consultas ambulatoriais nas especialidades abrangidas.
O novo Centro de Pesquisas Clínicas será uma estrutura centralizada e profissionalizada para o recrutamento e acompanhamento de pacientes e voluntários dos estudos clínicos que são realizados no complexo do HC, seguindo padrões nacionais e internacionais em pesquisa avançada. Além disso, R$ 20 milhões serão destinados para a aquisição de equipamentos para os centros cirúrgicos.
Oncologia e terapia intensiva
Do total de R$ 67 milhões liberados pela USP ao Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, R$ 50 milhões serão destinados ao Serviço de Oncologia e outros R$ 17 milhões para reforma e ampliação do Serviço de Terapia Intensiva do hospital.
Serão criados um Serviço de Diagnóstico Rápido e um ambulatório integrado de Oncologia, além do aumento de 25 novos leitos oncológicos, entre outras estruturas. Com o investimento, a unidade terá um incremento de 33% na capacidade de internações em oncologia, passando de 4,7 mil para 6,3 mil ao ano.