Tribuna Ribeirão
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A Colômbia e sua Literatura (31): Luis Vidales

Rosemary Conceição dos Santos*

 

De acordo com especialistas, Luis Vidales (1904-1990) tinha 26 anos quando publicou um pequeno livro de poemas de vanguarda, “Suenan timbres” (Campainhas tocam), única expressão na Colômbia do movimento que então varria a América Latina. Cinquenta anos depois,

nova edição adicionou muitos outros poemas, escritos naquela época, mas não incluídos na edição original. Depois daquele primeiro e extraordinário livro, Vidales escreveu apenas poesia social de protesto. Ele era um estatístico profissional e escreveu uma “História das Estatísticas Colombianas”, recebendo, em 1983, o Prêmio Lenin da Paz. O que se segue é uma evocação, por seu sobrinho, o poeta Juan Manuel Roca: “Falar de Luis Vidales no passado é trair sua convicção mais segura: a lei obstinada de que se vive, quando se vive plenamente, além do tempo mecânico do relógio. Aqui está Luis Vidales – com seu séquito de fantasmas – sussurrando para mim a palavra ‘vento’: uma palavra que faz as roupas nas arquibancadas ondularem. Quanto mais humildes esses trapos, mais eles são para ele a bandeira da poesia. Aqui está Vidales com seu amigo, o brilhante jornalista Luis Tejada, observando a mendiga em frente a uma igreja arrastando sua corte de cães góticos e vorazes. E aqui está Vidales rindo e fumando, ou tomando uma cerveja, ou caminhando pela estação de trem com aquele outro grande amigo seu, o grande cartunista Ricardo Rendón: no triunfo da Revolução entregarão o potente motor ao maquinista, uma promessa que é como um ‘abre-te sésamo’ que lhes permitirá viajar livremente, organizando trabalhadores e camponeses que nunca ouviram a expressão ‘mais-valia'”.

Continuando: “9 de abril (1948) – aquele dia fatídico em que Jorge Eliécer Gaitán foi assassinado e começou a guerra aparentemente eterna e sangrenta da Colômbia, com centenas de mortes e a destruição do centro de Bogotá – acaba de acontecer: na verdade, todo dia é 9 de abril para nós, pois sua conflagração ainda não diminuiu; ainda está fumegando; ainda é uma ferida aberta e sem cicatrização. Vidales sabe que em um país estático as pessoas andam, como alguns carros em filmes mudos, sem realmente se mover. Acabo de ver o seu sorriso fantasmagórico que, de alguma forma, faz lembrar o gato de Alice, deitado na cornija da minha casa: é o tempo “em que os gatos dormem” e “lá fora, nos telhados, as sombras caminham sozinhas”. Estas são as horas de Vidales, as de hoje e as de amanhã: “… são as minhas horas. Elas sabem disso e começam a se arquear como o dorso de um gato para que eu possa acariciá-las.”

Ainda: “Acabo de encontrar Vidales numa esquina de seus versos, numa virada de sua poesia, encostado em um poste de luz. Caminhei pelas ruas dos seus poemas, desviando de gatos, provando limões que são como ‘esferas de odor’, evitando fantasmas, um passante do seu discurso. Em seus gestos o vejo construindo torres de ar. No seu jeito de andar na rua eu entendo o seu jeito de trabalhar: todas as suas palavras nascem na rua e desembocam nos seus poemas. Ele nos ensinou, aqueles que vieram depois dele, a caminhar no mesmo país e no mesmo labirinto, a distinguir a diferença nos ecos das vozes.”

Um poema de Vidales?

 

NOTURNO NÚMERO OITO

Levar um rio fundo em nós mesmos cantando como uma criança

e o mar do tempo, em si mesmo, rugindo para as estrelas

noite e dia

E entrar no sonho sozinho, realmente sozinho,

acompanhado apenas pelo que você era naqueles dias

sem ajuda na cama

dos filmes do travesseiro

ou da colcha sob a qual os dedos fecham

a papoula de um país gigante:

o país escondido em que durmo

para que depois ele se torne maior

e sua multidão me faça companhia.

 

Em 1948, após o assassinato de Jorge Eliécer Gaitán, político e advogado colombiano, prefeito, ministro e candidato popular do Partido Liberal Colombiano à Presidência da República para o período 1950-1954, com altas probabilidades de ser eleito nas eleições de 1949 devido a seu grande apoio popular, em particular da classe média e baixa, Luis Vidales e sua família foram perseguidos pelo regime de direita e se exilaram no Chile. Retornaram à Colômbia em 1958 a convite do presidente Alberto Lleras Camargo. Vidales assumiu então a direção do Departamento Administrativo Nacional de Estatística. Após deixar o serviço público em 1978, retornou à luta política como ativista do Partido Comunista. Em 1979, durante o governo de Julio Cesar Turbay Ayala, unidades militares invadiram sua residência, detendo ilegalmente o poeta e sua esposa sob o pretexto de obter um mandado de prisão contra outra pessoa e procurar armas do grupo guerrilheiro M-19. Isso causou indignação na opinião pública nacional e internacional; entre os signatários das notas de protesto estava o filósofo francês Jean-Paul Sartre. No entanto, ele inicialmente se recusou a sair da prisão e exigiu que os trabalhadores detidos com ele também fossem libertados, e por isso entrou em greve de fome. Em 1982 ganhou o Prêmio Nacional de Poesia e em 1985 o Prêmio Lenin da Paz.

Professora Universitária*

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