Conceição Lima *
A China quer 100% de Inteligência Artificial na sala de aula, do ensino fundamental à educação superior.O Ocidente, disperso, ainda não esboçou uma união de pensamento, deixando a questão a critério de cada país, cada instituição e, em muitos casos, até mesmo de cada professor. Nesse meio de campo, o que existe é uma Babel dos tempos modernos: ninguém fala coisa com coisa.
Confesso que tenho lido e ouvido cada contradição a respeito da Inteligência Artificial na Educação! Culpa talvez da santa ignorância de se acreditar que ela seja tão somente o ChatGPT e seus assemelhados.
Embora tenha começado com eles, a IA vai muito, muitíssimo além de uma reles ferramenta dessas! Recentemente, o jornalista e romancista brasileiro Sérgio Rodrigues lançou um livro intitulado “Escrever é humano: como dar vida à sua escrita em tempo de robôs”, alertando de que todos os textos estão ameaçados pelas ferramentas de IA e de que a perda da prática da escrita pela população pode resultar em um retrocesso imensurável para a sociedade.
Segundo ele, vamos desaprender a escrever, enquanto que os robôs vão fazê-lo cada vez melhor… “O escritor tem razão? O ChatGPT está nos deixando burros?
”Certamente que a forma como usamos as ferramentas de IA pode desencorajar a curiosidade intelectual e criar uma dependência que limita o desenvolvimento cognitivo a médio e longo prazo.
Aliás, em 2008 uma revista americana, The Atlantic, numa provocativa matéria de capa, acusou o Google de fazer o mesmo em relação à sua tecnologia de facilitação da pesquisa.
Mas… a questão não é bem essa… Em quaisquer circunstâncias, pessoas mal-informadas e menos competentes tendem mesmo a não questionar nada, até porque elas nem saberiam fazer isso. Em contraste, as pessoas competentes,com certeza, questionarão a informação, venha ela de onde vier, das máquinas ou dos homens.
Assim é que alguns podem se apoiar em ferramentas de IA para substituir seu esforço cognitivo, enquanto outros o usam para potencializar suas capacidades. Tudo depende, afinal, do senso crítico de cada um.
Certas pessoas permanecem presas no “topo do monte dos burros”, usando essas ferramentas para substituir a criatividade e o pensamento crítico. Outras as usam para aumentar suas habilidades cognitivas existentes.
Na verdade, o que importa não é o fato de uma pessoa utilizara IA, mas a maneira como ela o faz. Aí é que está o cerne da questão. Visto que a IA não vai desaparecer, muito pelo contrário, vai permear cada vez mais cada aspecto de nossa vida cotidiana, não há mais como excluí-la do currículo escolar.
Porém, essa inclusão precisa ir muito além do simples uso de dispositivos e aplicativos. Ela precisa se debruçar e atuar sobre como os estudantes devem utilizar as respectivas ferramentas, conduzindo-os a uma compreensão crítica e consciente do mundo tecnológico, bem como capacitando-os a se tornarem cidadãos responsáveis e éticos.
Por outro lado, agora o homem se encontra perante um dilema vital: nos últimos dois mil anos, acumulamos um imenso saber cognitivo. No entanto, mesmo com todas as nossas descobertas e conquistas, estamos diante de uma crise sem precedentes, com um colapso pessoal e ambiental iminente.
As máquinas que ele treinou tornaram-se capazes de continuar aprendendo e evoluindo sozinhas e brevemente, supõe-se, serão capazes de ultrapassar o próprio patamar da intelectualidade humana.
“Então, o que será feito dessa pretensa intelectualidade do homem?” Até os dias presentes, a escola, se tanto, limitou-se a trabalhar tão somente com as habilidades intelectuais das pessoas, deixando de lado as habilidades emocionais, sociais e até espirituais que condicionam o comportamento e a convivência humana.
Aí estão o egoísmo, as desavenças, os preconceitos, a ambição desmedida, os homicídios, as guerras, a fome, a destruição ambiental a darem testemunho de que o ser humano tem se mostrado bem pouco inteligente, pelo menos emocional e (por que não dizer?) espiritualmente falando.
A Educação escolar não existe apenas para transmitir conhecimentos, o intelecto não é (ou não deveria ser) o fator preponderante na vida do homem. Então, surge uma série de questões irrespondíveis: “Por que será que a própria humanidade não consegue se humanizar, se ela depende tanto disso, até para sobreviver como espécie? O que há de errado conosco, com a nossa consciência, com a nossa Educação? O que aconteceu com a nossa essência humana?
” Eis que o homem é o que é através da aprendizagem, vale dizer, da Educação. Atualmente, a escola é o lócus ideal para promover essa Educação integral, pois envolve o indivíduo durante grande parte de sua vida.
“Se ela não o fizer, quem o fará?” Também, se a escola não assumir essa tarefa, creio que, doravante, ela não terá nenhum outro papel importante, a não ser funcionar como um “depósito” de pessoas que não têm para onde ir ou não sabem o que fazer…
* Doutora em Letras, com pós-doutorado em Linguística, escritora, conferencista e palestrante, membro eleito da Academia Ribeirãopretana de Letras e da Academia membro fundador da Academia Feminina Sul-Mineira de Letras

