Luiz Paulo Tupynambá *
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No início desta semana, o presidente dos Estados Unidos liberou um empréstimo de um bilhão de dólares para a Constellation Energy Corp. Parece uma operação de financiamento comum na indústria energética. Mas tem uma história toda por trás disso. O empréstimo foi feito para a reativação de uma unidade da usina nuclear de Three Mile Island. Como garantia, a Energy apresentou um contrato de fornecimento exclusivo de energia elétrica para um dos data centers da Microsoft naquela região. Essa unidade de fissão nuclear usa reatores de urânio para aquecer água, criar vapor e movimentar turbinas, gerando eletricidade. Foi paralisada em 1979, quando um acidente no reator número 2 causou um vazamento grave, o que obrigou a usina a ser fechada.
Curiosamente, um filme chamado “Síndrome da China”, havia sido lançado algumas semanas antes do acidente na usina, no estado da Pensilvânia. Era quase uma premonição do que aconteceu na realidade. Indicado a quatro Oscars, tem atuações memoráveis de Jack Lemmon, Jane Fonda e Michael Douglas. O nome do filme refere à possibilidade de um reator nuclear “vazar”, gerando um incêndio que perfuraria o planeta de um lado a outro e explodindo, lançando uma nuvem radioativa sobre uma grande área limítrofe. Foi considerado o acidente nuclear mais grave acontecido no hemisfério ocidental. Sua gravidade ficou logo atrás de Chernobyl (Ucrânia-URSS) em 1986 e de Fukushima-Daiichi (Japão) em 2011. Numa escala de zero a dez de perigo para a população, Chernobyl e Fukushima atingiram o nível 7 (acidente grave), com vazamento de material radioativo, mortes diretas e grande contaminação ambiental. Nos EUA, atingiu o nível 5, sem mortes ou feridos diretamente, mas com comprometimento por vazamento de gases e vapores radioativos. Desde 1979, Three Mile Island estava proibida de funcionar, mas a necessidade de gerar energia elétrica para abastecer os “buracos negros” da Inteligência Artificial começa a cobrar seu preço. Lá como cá: meses atrás a JBF, para entrar no mercado de energia elétrica, adquiriu um dos reatores da Usina de Angra dos Reis.
No mundo todo, movimentos em direção ao “renascimento” da energia nuclear vem tomando proporções mais sérias. Não que tenha acontecido uma grande melhora na segurança das usinas com reator nuclear. A manipulação humana teve problemas evidentes em Chernobyl e Three Mile Island. O que houve foi um aumento na adoção de sistemas de controle automatizados, ainda com supervisão humana qualificada.
A China, a grande poluidora mundial, vem fazendo um esforço gigantesco para substituir o carvão como fonte principal de geração de energia, por fontes renováveis. Porém o lado ocidental se mostra cada vez menos propenso a adotar medidas restritivas à queima de combustíveis fósseis. Petróleo e gás natural voltaram a ser a opção mais viável para a velocidade exigida pelo crescimento da IA. Geradores gigantes e mini termo-elétricas movidas a GNL ou diesel são realidade nos novos data centers que vem sendo instalados nos EUA. Já a energia nuclear, considerada fora do baralho depois da tragédia em Chernobyl, mostra claramente que vai voltar.
Talvez uma boa parte da logística mundial use substitutos renováveis para os combustíveis usados no transporte de cargas e pessoas. Mas isso não resolverá o problema dos gases de efeito estufa. A demanda por energia para abastecer a Economia da IA vai superar, e muito, a economia que faremos na logística.
Toda mudança de ciclo econômico exige uma nova fonte ou combinação de energias. Com vapor e petróleo criamos a revolução industrial como a conhecemos e domesticamos a energia elétrica. Mas qual será a energia ou a combinação que irá tocar a Revolução da Nova Economia? Para mim, parece clara a opção ocidental de manter a coisa como está e aumentar o uso da energia nuclear. Para gozo e delírio dos príncipes, dos donos das fortunas inesgotáveis e dos ditadores de plantão. Não importa a COP, tenha o número que for.
Na Netflix tem uma boa série documental sobre o assunto: “Meltdown – Reação Nuclear”.
* Jornalista e fotógrafo de rua

