A cada 24 horas, Ribeirão Preto perde, entre o trajeto dos poços artesianos e os reservatórios até a casa, o comércio ou a empresa dos usuários, 148,4 milhões de litros de água retirados do Aquífero Guarani.
Segundo dados levantados pelo Tribuna Ribeirão junto à Secretaria Municipal de Água e Esgotos de Ribeirão Preto (Saerp), dos cerca de 356,1 milhões de litros de água captados diariamente pelos poços artesianos da cidade, 41,67% se perdem no meio do caminho, em vazamentos visíveis e invisíveis.
Ribeirão Preto tem atualmente 123 poços tubulares, que alcançam mais de 200 metros de profundidade e são responsáveis pela captação de 14,84 milhões de litros de água por hora — o que corresponde a 6 piscinas olímpicas por hora e 144 por dia (numa piscina olímpica cabem, em média, 2 milhões e 500 mil litros de água). Contudo, o equivalente a 60 piscinas olímpicas literalmente vai para o ralo todos os dias, sem chegar ao usuário.

O total de reservatórios é de 137, com capacidade conjunta para armazenar mais de 170 mil metros cúbicos de água. Atualmente, Ribeirão Preto possui 217 mil ligações de água e mais de 2.370 km de redes de abastecimento, atendendo praticamente 100% da população urbana.
Apesar de os números demonstrarem uma rede de distribuição que interliga toda a cidade, Ribeirão Preto enfrenta um antigo e grave problema, muitas vezes imperceptível aos olhos da população: os vazamentos invisíveis da rede. Só para se ter uma ideia do tamanho do problema, de janeiro a outubro deste ano, a Saerp realizou cerca de 16 mil reparos de vazamentos em vias públicas e calçadas de toda a cidade — uma média de 28 reparos por dia.
De acordo com a Saerp, os vazamentos fazem parte do cotidiano há muitos anos e são resultado da precariedade da rede de distribuição — muitas vezes antiga e sem manutenção adequada ao longo das décadas. Outro fator que contribui para o problema é o sistema de abastecimento da cidade, utilizado em marcha.
Ou seja, quase toda a água captada nos poços vai diretamente aos consumidores, sem passar pelos reservatórios. Esse sistema provoca grande pressão em redes velhas e deterioradas, causando rompimentos e, consequentemente, vazamentos.
Para diminuir as perdas, a administração municipal afirma ser necessário atuar em várias frentes: implantação de novas redes, substituição de trechos antigos e modernização gradual da estrutura.
Outra medida essencial é inverter o atual sistema de marcha — que leva a água diretamente dos poços ao consumidor — para o método por gravidade, em que toda a água captada segue primeiro aos reservatórios para, só então, ser distribuída.
Essa alteração reduziria significativamente os vazamentos, pois eliminaria as grandes oscilações de pressão nas tubulações — um dos principais fatores de rompimento.
A Secretaria Municipal de Água e Esgotos informa ainda que tem atuado de forma contínua. Entre as ações recentes estão:
• implantação de 6 km de novas redes,
• perfuração e inauguração de poços tubulares profundos nos bairros Campos Elíseos (zona Norte) e Lagoinha (zona Oeste),
• entrega de um novo reservatório no Parque Ribeirão (zona Oeste).
Está em andamento o processo licitatório para perfuração de quatro novos poços, construção de um reservatório e ampliação das redes. O investimento é de R$ 43 milhões e deve beneficiar mais de 350 mil pessoas.
Ribeirão propõe uso racional para diminuir consumo
Em média, cada habitante de Ribeirão Preto consome 295 litros de água por dia. O número resulta da quantidade de água captada diariamente — que efetivamente não se perde na rede — dividida pelos 703.710 habitantes da cidade, segundo o Censo 2022 do IBGE. Dos 356,1 milhões de litros captados diariamente pelos 123 poços artesianos, 207,7 milhões de litros chegam ao destino.
Para a Secretaria Municipal de Água e Esgotos de Ribeirão Preto (Saerp), o elevado consumo de água no município está associado a dois fatores principais: o clima local e a falsa sensação de abundância.
O fator climático está diretamente ligado às altas temperaturas e à baixa umidade do ar durante grande parte do ano, o que leva a população a ingerir mais água e intensificar atividades como limpeza e banhos.
Já a falsa sensação de abundância está relacionada à fonte de abastecimento: Ribeirão Preto é uma das poucas cidades de grande porte abastecida exclusivamente pelo Aquífero Guarani. Diferentemente de cidades atendidas por rios e represas — onde é possível ver visualmente a escassez hídrica — o ribeirão-pretano não visualiza o nível do aquífero, o que gera a impressão equivocada de recursos infinitos.
Para conscientizar a população sobre o uso racional da água, a Saerp desenvolve projetos no Centro Educacional da autarquia, com ações educativas para alunos do Ensino Fundamental. Eles aprendem sobre o sistema de abastecimento, o funcionamento do Aquífero Guarani e as atitudes cotidianas necessárias para evitar desperdícios. De janeiro a outubro, o Centro já recebeu mais de 2 mil alunos.
Brasil perde 6 mil piscinas de água tratada por dia, diz estudo
O Brasil desperdiça diariamente o equivalente a 6.346 piscinas olímpicas de água tratada antes que ela chegue às torneiras. O cálculo integra o Estudo de Perdas de Água 2025, divulgado pelo Instituto Trata Brasil (ITB) em parceria com a GO Associados.
O levantamento utiliza dados do Sistema Nacional de Informações em Saneamento (SNIS) de 2023 e revela que o país perdeu 5,8 bilhões de metros cúbicos de água tratada em um ano — volume suficiente para abastecer cerca de 50 milhões de pessoas.
As perdas totais representam 40,31% da água produzida, percentual acima da meta de 25% definida pela Portaria 490/2021 do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional.

As regiões Norte (49,78%) e Nordeste (46,25%) têm os piores índices, com estados como Alagoas (69,86%), Roraima (62,51%) e Acre (62,25%) desperdiçando mais da metade da água produzida. Goiás (25,68%), Distrito Federal (31,46%) e São Paulo (32,66%) figuram entre os melhores resultados.
É considerada perda de água aquela que ocorre por vazamentos, erros de medição e consumos não autorizados. Segundo o estudo, apenas as perdas físicas, especialmente vazamentos, ultrapassam 3 bilhões de metros cúbicos por ano — volume capaz de abastecer 17,2 milhões de pessoas por quase dois anos.
As perdas também geram custos adicionais: gasto maior com produtos químicos, energia, manutenção e captação desnecessária em mananciais já pressionados pelas mudanças climáticas.
O impacto ambiental é direto: a necessidade de captar mais água do que a demanda real aumenta a pressão sobre rios e reduz a disponibilidade hídrica. Em um país que enfrenta secas prolongadas, calor extremo e alteração no regime de chuvas, o cenário tende a se agravar. Segundo o estudo, 34 milhões de brasileiros ainda não têm acesso à água tratada.
Se o Brasil reduzisse o índice atual para 25%, economizaria 1,9 bilhão de m³ de água — volume equivalente ao consumo de 31 milhões de pessoas em um ano. O ganho econômico estimado é de R$ 17 bilhões até 2033, valor que reforçaria a resiliência dos municípios frente às mudanças climáticas.

