Tribuna Ribeirão
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A metalúrgica de Ribeirão

Rui Flávio Chúfalo Guião * 
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Nos anos 1920, Ribeirão Preto vivia o auge do ciclo do café. Fazendeiros enviavam sua produção para o exterior, gerando uma classe de empreendedores endinheirados, que decidiram dotar a cidade de confortos europeus. Palacetes, novos edifícios, praças foram construídos. O Teatro Carlos Gomes, erguido pelos cafeicultores, marcava a vida cultural da cidade, que compreendia também atividades glamorosas, proporcionada pelo célebre cabaré do francês Cassoulet. Vários cinemas ofereciam as mais novas produções. E a Praça XV, onde nasceu a cidade, recebia a fina flor da sociedade, no footing dominical 
 
A Companhia Antarctica Paulista e a Companhia Cervejaria Paulista brigavam pela liderança na venda das cervejas e refrigerantes. No comércio, destacavam-se a Casa Alemã e a Diederichsen. Várias escolas ensinavam as letras para as crianças e os jovens. 
 
Em 1920, Flávio de Mendonça Uchoa decidiu dotar a cidade de pioneira siderúrgica. 
 
Flávio nasceu em Estância, Sergipe, em 1870, formou-se  engenheiro na Escola Politécnica do Rio de Janeiro e, no final do século XIX, aportou em nossa cidade para ser gerente da Fazenda Guatapará, grande produtora de café da família Prado, casando-se com uma das filhas do proprietário, o Conselheiro Antônio Prado. Empreendeu várias obras de higienização e limpeza urbana da cidade, construiu uma hidrelétrica na confluência do ribeirão Preto e córrego do Retiro, constituindo a Cia. de Força e Luz, com abrangência regional. 
 
Em 28 de fevereiro de 1920 foi constituída a Cia. Eletro-Metalúrgica Brasileira, a segunda de grande porte a ser implantada no país, logo após a Belgo-Mineira, de Minas Gerais. Dr. João Alves Meira Júnior foi eleito presidente, igual cargo que tinha na Companhia Cervejaria Paulista. 
 
Depois de longa viagem à Europa em visita a siderúrgicas, Flávio decide comprar dois fornos elétricos suecos e uma grande área no bairro Tanquinho, com 600.000 m², nela instalando a nova indústria. Para viabilizar a construção da usina, traz engenheiros suecos. O minério de ferro viria de jazida nos arredores de São Sebastião do Paraíso, do Morro do Ferro, daí a compra da Estrada de Ferro São Paulo-Minas, que ligava Bento Quirino àquela cidade. Um ramal da ferrovia foi estendido até Ribeirão Preto. 
 
No dia 27 de agosto de 1921, a metalúrgica foi festivamente inaugurada, com a presença do Presidente da República, Epitácio Pessoa, do Presidente do Estado de São Paulo, Washington Luiz, do Ministro da Indústria e Comércio, Pires do Rio, do Ministro da Marinha e ex-prefeito Veiga Miranda, solenidade presidida pela Prefeito Municipal João Rodrigues Guião. 
 
Houve banquetes, baile, discursos que repercutiram em todos os grandes órgãos de imprensa do país. As autoridades trajavam fraque e cartola e o ambiente era de grande solenidade, conforme pode se ver das fotos publicadas em jornais e revistas da época. Os 90 capitalistas de Ribeirão Preto que subscreveram o capital da nova empresa lançavam a industrialização pesada em nossa cidade. 
 
A produção começou acelerada, com produtos de alta qualidade. Basta realçar que todo o ferro e aço usado na construção do Edifício Martinelli, em São Paulo, o mais alto  da América Latina veio de nossa metalúrgica. 
 
Mas, o sonho durou somente nove anos. As jazidas do Morro do Ferro eram menores do que se pensava e houve necessidade de buscar minério muito longe, aumentando drasticamente o custo de produção. 
 
Mas, o golpe de misericórdia veio com a quebra da Bolsa de Nova York, em 1929, que lançou o mundo em crise então nunca vista. À Metalúrgica não restou outra saída senão pedir concordata. Os pedidos diminuíram, as dificuldades aumentaram e a sua falência foi decretada em 1930, mesmo ano da revolução getulista, que apearia os cafeicultores do poder. 
 
* Advogado e empresário, é presidente do Conselho da Santa Emília Automóveis e Motos e secretário-geral da Academia Ribeirãopretana de Letras

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