Elson de Paula *
elsontpaula@gmail.com
“O perigo da meia verdade é que você expõe que junto dela também há uma meia mentira.” (Millôr Fernandes)
Como militante na defesa da População em Situação de Rua, nunca vi nessa cidade, tanto se falar da Pop Rua como se tem falado nos últimos 20 dias, especialmente nas redes sociais.
Neste período, apenas no Instagram, já contei mais de 10 publicações, algumas do Prefeito, outras do Secretário da Assistência Social e outras de influencers e pseudo jornalistas, alguns dizendo que estão fazendo a sua parte, outros apontando o problema de forma irresponsável e desumana, sem nenhum cuidado com a notícia verdadeira, com ética e com postura humana expondo essas pessoas em situação de vulnerabilidade extrema em benefício próprio. Nelas vigora apenas o sensacionalismo.
Essas publicações passaram a ser comuns neste ano, após a nova gestão pública municipal assumir a Prefeitura, e poderíamos dizer que é bom, pois como muitos passaram a acreditar, até que enfim um prefeito está olhando para estes nossos irmãos e irmãs em situação de rua.
Mas não, não é bom, pois quando se faz um vídeo como esses, falando de um tema tão complexo, que deveria envolver uma postura mais cuidadosa, preocupada com a instalação de Políticas Públicas plenas e eficazes para se resolver o problema, o que não acontece em nossa cidade há décadas, se expõe “meias verdades” que maquiam para a população em geral o que não está sendo feito, causando na maioria dos munícipes ribeirão-pretanos a sensação de que “agora vai”, mas na verdade “não está indo”.
Quando um prefeito (ou um secretário) apresenta em suas redes sociais que está acolhendo “moradores de rua” em abrigos para pernoite nesse inverno, tirando-os da frieza da calçada e protegendo-os, causa empatia em seus seguidores, que os elogiam em likes e comentários, essa é a “meia verdade” da publicação.
A “meia mentira” que não fica clara nestas publicações, é que o que a atual gestão está fazendo nada mais é que repetir o que a anterior já fazia no que chamamos de Protocolo de Inverno, quando a temperatura chega aos 13º (ou abaixo disso), abre-se nas Casas de Passagens, vagas para pernoite (apenas para dormir) para quem está em Situação de Rua, e o que não se esclarece nessa hora, é que hoje são oferecidas apenas 60 vagas para pernoite, para um universo de mais de 1.700 pessoas em situação de rua, e além, o que se faz é distribuir cobertores para quem continuará dormindo na calçada dura e gelada, e sem alimentação.
As “meias verdades” tem conquistado a opinião e o apoio público, mas isso é passageiro, o problema continua.
Esse problema não deixará de existir, como acontece em Ribeirão Preto há décadas, a um custo muito negativo para a nossa cidade, pois enquanto isso, a População em Situação de Rua cresce a cada dia.
E sem o olhar técnico, humano e responsável, que alcance soluções mais sérias e planejadas, não chegaremos a lugar melhor nenhum.
Precisamos da busca de soluções não apenas na Assistência Social, erradicando a fome e a miséria dessas pessoas, mas também na Saúde Municipal, com a instalação de programas e Políticas Públicas que tratem adequadamente da saúde mental dessas pessoas, da dependência de uso de álcool e drogas, do crescimento da tuberculose como tem o ocorrido nos últimos anos em nossas ruas, e ainda da falta de moradia para essa gente, de trabalho digno, bem remunerado e sem exploração, e mais, da preocupação com programas de formação profissional e educação, de justiça e segurança; é disso que a Pop Rua precisa, e não de esmola com um cobertor para dormir por uma noite inteira, numa calçada dura e gélida, e ainda, de barriga vazia.
Chega de “meias verdades”!
Pensemos nisso!
* Jornalista, representante técnico do Movimento Nacional de Luta na Defesa da População em Situação de Rua( MNLDPSR) cofundador do Fórum de Defesa da População em Situação de Rua de Ribeirão Preto e vice-presidente do Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS)