Rui Flávio Chúfalo Guião *
A ideia da escolha do cidadão para cargos importantes da comunidade através do voto perde-se no tempo. Porém o voto secreto levou alguns séculos para ser adotado. Os gregos, no século V a.C já o praticavam em algumas situações graves, como o ostracismo. Os romanos, em 139 a.C, decidiram-se pelo voto secreto, como uma forma de evitar a influência da aristocracia de Roma.
A primeira constituição francesa após a queda da Bastilha, em 1795, durante o Regime do Diretório, estatuía que “Todas as eleições deveriam ser realizadas por escrutínio secreto”. Durante o período colonial brasileiro, havia eleições a cada três anos para eleger os vereadores das câmaras, num processo rígido, de voto “no sigilo do ouvido”ou seja, a descoberto, exercido pelos “homens bons”, a elite da comunidade.
Eram poucos aptos a votar e a maioria da população era excluída do pleito. Às mulheres era proibido votar, mas os analfabetos livres poderiam exercer este direito. As autoridades gerais eram todas nomeadas por Lisboa. Com o Império, iniciado em 1822, votava-se para eleger deputados e senadores.
A eleição era feita em duas etapas. Na primeira, elegiam-se os eleitores, dentre pequena parcela da população e estes elegiam os membros do legislativo. O voto não era secreto. Com a Proclamação da República, depois do período inicial dos governos Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, instituíram-se eleições gerais, sendo poucos os que tinham direito a votar.
Predominava o voto a descoberto, o famoso “voto de cabresto”, Criava-se o coronelismo, onde os senhores do café de São Paulo e os agricultores de Minas Gerais dividiam o poder. Com o surgimento do tenentismo, movimento da juventude das Forças Armadas, começou-se a falar constantemente da necessidade do voto secreto, como forma de efetiva participação popular e afastamento da pressão das oligarquias.
O Centro Acadêmico XI de Agosto, fundado em 1903, sendo seu nome uma homenagem à data em que o Imperador Pedro I autorizou a criação dos cursos jurídicos no Brasil, é a mais antiga instituição acadêmica e estudantil do país. Além de congregar os alunos da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, o XI de Agosto tornou-se símbolo de liberdade e democracia, participando ativamente dos movimentos sociais e políticos da nação, atuação que perdura até hoje.
Nas décadas de 1910 e 1920, a intelectualidade brasileira manifestava seu desagrado pelo voto a descoberto e iniciou movimento para sua transformação em secreto.O XI de Agosto, desde cedo, colocou-se ao lado destas reivindicações. Em seus encontros e eventos, o assunto era amplamente introduzido e debatido pelos acadêmicos e professores, bem como jornalistas e políticos. Para dar exemplo ao país, o XI de Agosto instituiu, em 1925, há cem anos, o voto secreto para a eleição de sua diretoria. Era Presidente do Centro Onésio Bueno de Camargo, e Secretário-Geral meu pai João Palma Guião.
O fato serviu de manchete para a imprensa paulista e nacional, que deu ampla publicidade ao mesmo, colaborando assim para a decisão que viria em 1932, logo após a Revolução Constitucionalista, com a adoção do primeiro Código Eleitoral, que, previa, entre outras disposições, o voto secreto e o voto feminino.
* Advogado e empresário, é presidente do Conselho da Santa Emília Automóveis e Motos e secretário-geral da Academia Ribeirãopretana de Letras

