Tribuna Ribeirão
Artigos

A Literatura Paraguaia na Contemporaneidade: Delgado, Alcalá, Gertopán e Cabrera

Suzi Delgado (1949 – ) é cidadã paraguaia, poetisa, escritora e contadora de histórias. Graduada em Sociologia, trabalhou como jornalista para o jornal “Hoy” e foi editora da área Entretenimento e do Suplemento Cultural do jornal “La Nación”, durante vários anos. Ganhou reconhecimento internacional em 1985 como finalista de um concurso de poesia espanhola em Madrid. Em 2017, venceu o Premio Nacional de Literatura do Paraguai com seu poema Ybytu yma. De sua autoria são as obras “El patio de los duendes”, “Alrededor del fuego” (editado em três idiomas), “Sobre el beso del viento”, “Antología primeriza” y “La sangre florecida”, entre outros. De acordo com estudiosos de sua obra, Delgado apresenta-se no campo da literatura como uma das vozes latino-americanas fundamentais a discorrer sobre a expressão da vida cotidiana paraguaia, destacando aspectos significativos de sua cultura e dos conteúdos que causam. Nesse sentido, sua obra poética constitui atitude exemplar para a ainda necessária descolonização da América Latina, com a linguagem do colonizado e a do colonizador ocupando o mesmo espaço e recebendo a mesma valorização.

Guido Rodrigues Alcalá (1946 – ) é poeta, narrador, historiador, jornalista, ensaísta e crítico literário paraguaio. É colaborador assíduo de diversos jornais locais e internacionais. Inicialmente, seus trabalhos literários focaram um sujeito histórico regular, baseado no restabelecimento de figuras paraguaias mistificadas pela ditadura, visando ampliar sua perspectiva de conexão internacional da indepen­dência paraguaia. No caso, em “Artigas y La Independencia del Paraguay”, Alcalá traz uma ampla seleção de cartas trocadas entre Artigas e o Conselho de Governo do Paraguai, que mostram alguns aspectos menos conhecidos da história do país. Por sua vez, em “Residentas, destinadas y traidoras”, o autor trata de histórias vívidas dos protagonistas da Guerra do Paraguai, ressaltando que, os residentes/morado­res eram as mulheres que não tiveram nenhum infortúnio com o presidente; ao passo que, as destinadas ou traidoras eram as mulheres obrigadas a entrar em campos de concentração por serem parentes de inimigos do presidente. Seu romance “Caballero”, paródia da biografia do general paraguaio Bernardino Caballero, surge em meados da década de 1980, como publicação revisionista da libertação do povo paraguaio do sistema bárbaro e tirano dos governos que o haviam mantido ilhado em relação às nações civilizadas. Com o arre­fecimento do governo ditatorial, manifestam-se no Paraguai os impulsos de se oferecer uma construção intelectual diferente a respeito da guerra. Revisionismo, este, fundamental nas décadas seguintes, principalmente para o imaginário decorrente do mesmo.

Em 2002, seu romance “Velasco, contextualizado pouco antes da independência do país, coloca a literatura paraguaia cor­retamente em seu ambiente regional, examinando os processos políticos que permitiram alcançá-la, bem como, especulando, a partir de diversos documentos, o que tinha realmente acontecido no país. Velasco, nome do primeiro governador da Província de Misiones e, desde 1806, também governador do Paraguai, foi o último representante nomeado pela Espanha em circunstâncias muito pouco claras, derrubado num dia de maio de 1811 e, imediatamente, incluído no governo temporário, supostamente inde­pendente, que se formou no dia seguinte do mesmo ano. É um hiato autoral do sujeito histórico regularmente utilizado em sua ficção, baseado no restabelecimento de figuras mistificadas paraguaias pela ditadura, visando ampliar a perspectiva autoral sobre a conexão internacional da independência paraguaia. A conclusão a que o autor chega? É a de que a política paraguaia é algo preso ao processo de desenvolvimento dos países vizinhos, com as relações exteriores na política nacional constituindo-se elemento maior do que normalmente se pensa e não apenas nas perspectivas políticas que culpam os outros países ou o imperialismo inglês pelos desastres bélicos. Revisitação deste período, “Velasco” questiona as ações e reações humanas visando reivindicar um novo ponto de vista sobre o que poderia ter acontecido desde a reinterpretação permitida pela ficção. Em conjunto com seus demais livros, trata-se de obra que valida a narrativa histórica no Paraguai durante a mudança de século, revelando ao leitor a existência de maduros autores paraguaios que souberam criar uma voz literária própria.

Susana Gertopán (1956 – ) é escritora paraguaia dedicada tanto à história quanto à poesia e ao romance paraguaios. Descendente de judeus que fugiram da Europa durante a Segunda Guerra Mundial, sua literatura foi publicada em antologias, periódicos e revistas do seu país e do exterior. Segundo estudiosos, trata-se de obra rica em descrições que, através de diálogos bem construídos e atmosfera local bem delineada, permite ao leitor questionar o mundo, o exílio e as consequências do desenraizamento dos povos. Através de suas recordações memorialísticas, a visão feminina frente ao holocausto, à diáspora e às relações de gênero, que marcaram/marcam a cultura judaica, são expostas com sensibilidade e inteligência. De sua obra, alguns títulos foram traduzidos para o inglês e para o alemão (“Barrio Palestina” (1998); “El nombre prestado” (2000); “El retorno de Eva” (2004); “El otro exilio” (2007); “El equilibrista” (2009); “El callejón oscuro” (2010); “El guardián de los recuerdos” (2012); “El fin de la memoria” (2014); “El señor Antúnez” (2015); “Primera Pregun­ta” (2017); “Todo pasó em setiembre” (2019). Acrescente-se a estes títulos dois contos publicados “Una noche especial” (1992); “7285” (1995). Entretanto, apesar do número significativo de obras e da proximidade fronteiriça entre os países, não há muitos trabalhos críticos analisando a mesma. Segundo estudiosos, suas narrativas refletem sobre os dilemas da humanidade. Tratam do exílio, da diáspora e, dentro dessa discussão, é o leitor quem deve refletir sobre as relações entre gerações, gêneros e culturas.

Damián Cabrera (1984 – ) é escritor, pesquisador, professor, gestor cultural e curador paraguaio, autor de textos de ficção, ensaios e textos críticos. De acordo com estudiosos, em sua ficção, Cabrera vai além da utilização das línguas de tradução do conhecimento e coloniais, que são português e espanhol, porque utiliza a língua de cultura que é o guarani, e ainda faz uso da oralidade e do mito, não separando as mentalidades dos personagens. Nele, o mítico está presente como real, mas ultrapassando a crença e a fantasia. Por meio de discurso multifacetado e fragmentário busca romper com argumentos lineares, de forma que as histórias de seus personagens se transformem em uma série de vinhetas aparentemente dispersas. Uma estrutura discursiva que, por seus tratos linguísticos, revela-se impactante. Seu romance “Xirú” trata das mobilidades e resistências culturais, linguísticas e geopolíticas que ocorrem na fronteira Paraguai/Brasil/Argentina. A partir de uma análise ética, postulado, segundo a crítica, identificações, diferenças e (re)construções marcadas por tensões, distensões e desvios desse imaginário território fronteiriço.

Postagens relacionadas

Ficção e realidade, ficadas e relacionamentos sérios

Redação 1

A transparência é o melhor caminho

Redação 1

Um presidente como poeta

Redação 1

Utilizamos cookies para melhorar a sua experiência no site. Ao continuar navegando, você concorda com a nossa Política de Privacidade. Aceitar Política de Privacidade

Social Media Auto Publish Powered By : XYZScripts.com