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Sócrates, Castor de Andrade e Marinho

Castor de Andrade (12/02/1916-11/04/1997). Estava lendo sobre ele outro dia, que por muito tempo comandou o “inocente” jogo do bicho no Rio de Janeiro e até em outros estados. Vi uma entrevista dele no programa do Jô Soares em que, sorrindo, falava da origem de seu império, quando ainda era menino. Disse que a avó, para ajudar nas despesas da casa, começou a mexer com a loteria do mundo animal. O pai, que era maquinista ferroviário, percebendo ali um negócio lucrativo, deixou o emprego e passou a ajudar a mãe e o negócio prosperou. No fim, sobrou pra ele e virou o que virou.

Castor tinha o costume de andar escoltado até por 23 seguranças. Lembro de um repórter descrevendo Castor a medida em que ele se aproximava – “lá vem ele rumo a seu luxuoso carrão, passos largos, chapéu lindo, terno de fino corte, sapato de cromo alemão e meias importadas”. Era super-simpático, cara de bom pai e avô carinhoso, andava pelas ruas distribuindo sorrisos, mas quando saía do sério, sai de baixo. Resolvia tudo na bala. Formado em Direito, de boa cultura, era amigo de ministros e outros babados mais.

Moça Bonita – acho lindo este nome –, estádio do Bangu. Castor era tudo para o clube, herdou a paixão pelo alvirrubro do pai, que havia sido presidente nos anos 60. Os jogadores que caíam na sua graça nadavam de braçadas na grana. O saudoso craque Marco Antônio dizia que Castor era a Serra Pelada de sua vida.

Algumas frases ditas pelo tão falado bicheiro viraram folclore – “Se não tiver torcida eu mando comprar” ou “Tenho amigos de esquerda, de direita e do centro, não tenho culpa se mudam de lado”. Castor era o tipo de dirigente que não existe mais e que na minha opinião faz enorme falta ao mundo esportivo. O saudoso jornalista João Saldanha, um apaixonado por futebol que comandou a seleção brasileira na fase pré-Copa de 1970, estava no estúdio de TV e comentou que o bicheiro e contraventor Castor de Andrade havia subornado o goleiro Manga, do Botafogo.

O homem que a tudo assistia ficou uma fera, pegou seus seguranças, correu pra TV e invadiu o estúdio com duas máquinas (revólveres) nas mãos. Castor disse que foi um corre-corre danado. Pois bem, revelou o bicheiro, “o Saldanha era macho mesmo e me enfrentou”. Tempos depois, resolveu ir pra cima de Saldanha enquadrando-o num processo. Ao ser ouvido, o jornalista deu uma de bagre ensaboado: “Castor é um homem importante para o nosso futebol, nada sei sobre sua vida particular e nada mais falarei”. Castor fechou: “Isso é o que eu chamo de dignidade.”

Sócrates contou-me certa noite que, na Copa de 1986, Telê Santana convocou o ponta-direita do Bangu, o jogador Marinho, que explodiu no América de São José do Rio Preto e que Castor de Andrade espertamente contratou. Pois bem, lá na Toca da Raposa, CT do Cruzeiro, onde a seleção treinava, ele percebeu que Marinho havia se isolado, passando ares de que algo o incomodava. Sócrates sacou o momento “deprê” do ponta e foi até ele, que disse: “Sócrates, mudamos faz pouco tempo para o Rio de Janeiro, não temos amigos ainda e minha esposa, para não ficar sozinha, trancou a casa e foi pra casa da mãe em Rio Preto. Voltou hoje e encontrou nossa casa arrombada, levaram tudo, e eu aqui não tenho como ajudá-la”.

Magrão, na hora, disse: “Marinho, você esqueceu que o presidente do seu time é o Castor de Andrade? O Rei do Rio? Vamos ligar pra ele.” Não deu outra. Castor, como um velho pai dando conselhos ao filho, calmamente falou: “Marinho, meu filho, fique tranquilo, vou acomodar sua família num hotel e colocar segurança em sua casa 24 horas, só te peço três dias e tudo estará em sua casa de volta, o que mais quero é que você tenha paz para representar nosso Bangu nesta maravilhosa seleção.”

Segundo Sócrates, dois dias depois Castor de Andrade ligou pra Toca da Raposa dizendo pro Marinho ficar tranquilo que sua casa havia recebido mais coisas do que levaram e que a segurança permaneceria enquanto ele estivesse na seleção.

Sexta conto mais.

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