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Tédio e falta de motivação afetam cada vez mais profissionais

Como identificar e superar esse comportamento; dados mostram queda global no engajamento dos funcionários (Reprodução)

Por Adriana Cristofoli

Nos últimos anos, muito se tem falado sobre o Burnout [Síndrome de Burnout] e os efeitos do excesso de trabalho na saúde mental. No entanto, um outro fenômeno, mais silencioso, tem atravessado o cotidiano de muitas pessoas e merece atenção: o Boreout [Síndrome de Boreout] – termo que designa o esgotamento psíquico gerado não pela sobrecarga, mas pela subutilização das capacidades, pela falta de desafios e, sobretudo, pela ausência de sentido na experiência laboral.

Felipe Areco declara que essa condição leva a sintomas como desânimo, ansiedade, irritabilidade e até quadros depressivos (Arquivo Pessoal)

Do ponto de vista psicológico, o trabalho ocupa um lugar importante na construção do projeto de vida. É através dele que o sujeito se vê no mundo, estabelece vínculos, compromissos e se reconhece como agente. Quando essa vivência se dá sob o signo do vazio e da inutilidade, o sentimento existencial de “não estar sendo” pode emergir com força.

Para o psicólogo Felipe Areco, Mestre em Ciências pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo – EERP-USP e doutor em Ciência, Tecnologia e Sociedade pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar, o Boreout não é um simples tédio ocasional. “Ele revela uma forma de sofrimento que se instala na repetição de tarefas desconectadas da realidade do sujeito, na invisibilidade diante da equipe, na sensação constante de que se está ocupando um lugar sem presença. Não raro, essa condição leva a sintomas como desânimo, ansiedade, irritabilidade e até quadros depressivos”, alerta.

Felipe afirma que numa sociedade orientada pela lógica da produtividade e da performance, é difícil reconhecer o adoecimento que vem da falta. Falta de escuta, de reconhecimento, de vínculos significativos. “Mas é justamente aí que se encontra o desafio ético da Psicologia: oferecer espaços de acolhimento em que a experiência do sujeito possa emergir com legitimidade, sem ser reduzida a métricas ou diagnósticos”, observa.

“Enquanto psicólogos, cabe-nos olhar para esse fenômeno com a escuta atenta que respeita a singularidade de cada trajetória. E, nas instituições, fomentar práticas que resgatem o valor do trabalho como lugar de sentido, expressão e pertencimento – não apenas como exigência de produção”, finaliza.

Para Virgilio Marques dos Santos, o boreout é um sinal preocupante para organizações que já enfrentam dificuldades de produtividade (Isaque Martins)

Para Virgílio Marques dos Santos, sócio-fundador da FM2S, startup de Educação sediada no Parque Científico e Tecnológico da Universidade de Campinas-Unicamp e PhD pela mesma instituição, trata-se de uma “síndrome silenciosa” que impacta diretamente a motivação e o bem-estar dos trabalhadores. “O risco maior é naturalizar o tédio, aceitar que trabalhar sem envolvimento é normal. Isso representa um desperdício do potencial criativo humano, que precisa de sentido para florescer”, afirma Santos.

Embora ainda não existam estatísticas globais consolidadas sobre a incidência do Boreout, dados recentes do Instituto de Pesquisa Gallup indicam que o engajamento global dos funcionários caiu para 21% em 2024, com os gestores apresentando a maior queda. Isso marca apenas a segunda queda no engajamento nos últimos 12 anos — um sinal preocupante para organizações que já enfrentam dificuldades de produtividade, conforme aponta o Relatório sobre o Estado do Ambiente de Trabalho Global.

Para Santos, o Boreout não deve ser encarado como frescura ou luxo, mas como um sinal de desalinhamento entre o profissional e as atividades que executa. “O trabalho, para ser digno, precisa engajar e ter utilidade. Ficar à deriva, esperando que a semana termine, é desperdiçar uma parte valiosa da vida produtiva”, conclui.

Boreout representa um desperdício do potencial criativo humano, que precisa de sentido para florescer (Reprodução/Redes Sociais)

Passos para identificar

Virgílio Marques dos Santos elenca cinco passos que podem ajudar profissionais a identificar e superar o Boreout:

  1. Reconhecer sem culpa

Admitir o tédio e a falta de motivação não é sinal de fraqueza, mas de consciência profissional. “É um alerta do corpo e da mente de que algo precisa mudar. Identificar essa situação é o primeiro passo – e o mais corajoso”, explica Santos.

  1. Conversar com alguém de confiança

Buscar apoio dentro da organização pode ser um caminho. O especialista sugere abordar a questão com líderes ou colegas de confiança: “Não é preciso dramatizar. Pode começar dizendo: ‘Sinto que posso contribuir mais do que estou contribuindo hoje. Podemos pensar em algo juntos?'”.

  1. Propor soluções, não apenas relatar o problema

Demonstrar disposição para assumir novos desafios é essencial. Participar de projetos interdisciplinares ou sugerir melhorias em processos são alternativas. “O desejo de sair do tédio deve ser apresentado como vontade de agregar valor”, orienta Santos.

  1. Criar desafios pessoais

Quando a organização não oferece oportunidades suficientes, é possível buscar desenvolvimento por iniciativa própria. “Aprender uma nova ferramenta, estabelecer metas de qualidade ou produtividade são maneiras de manter a mente ativa”, recomenda.

  1. Reavaliar a trajetória profissional

Se o quadro for persistente e sem perspectiva de mudança, o especialista sugere uma reflexão mais profunda: “Este trabalho ainda conversa com meus valores? Tenho espaço para crescer aqui? Quero estar neste lugar daqui a um ano?”.

 

 

 

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