Rui Flávio Chúfalo Guião *
Como faz há bastante tempo, a Academia Ribeirãopretana de Letras patrocinou o concurso Zoraide Rocha de Freitas durante a nossa Feira Internacional do Livro, recém terminada. O concurso leva o nome da grande educadora, que faleceu aos 100 anos, depois de dedicar sua vida ao aperfeiçoamento do ensino, pioneira que foi na sua forma profissionalizante.
Foi integrante da Academia, titular da Cadeira 19, cujo patrono é Vicente de Carvalho. Neste ano, o tema das crônicas foi “À Margem da Vida” e foram apresentados vários trabalhos muito interessantes e de alta qualidade. Dentre esses, três se destacaram e levaram o Prêmio Zoraide de Freitas.
Na última quarta-feira, dia 10 de setembro, a Academia Ribeirãopretana de Letras realizou mais uma sessão de seu programa Encontros Culturais Online, recebendo os três vencedores, que foram apresentados aos acadêmicos e convidados e falaram de sua postura face à literatura, seu processo criativo, sua vida de escritor.
Como foi realçado na reunião, os premiados já são escritores natos, produziram obra variada e profunda, com ideias originais e muito bem lançadas, sendo portanto novos talentos da literatura. Lúcio Rodrigues Júnior, morador de Tatuí, SP, brindou a todos com sua crônica “Vida à beira, nem dentro, nem fora”, onde com humor e ironia deu voz ao narrador que estava à margem da vida.
“Outro dia percebi que minha vida estava, digamos, ligeiramente à margem. Não a margem no sentido poético, tipo “sou um observador da existência, um flâneur das emoções “
Nada disso. Era à margen no sentido bancário mesmo: saldo insuficiente “ Introduz o Sr. Antônio, padeiro que lhe fia sempre, aconselhando-o a não se importar com a situação e estimula-o a viver como um marginalizado, não um marginal. Interessante crônica, pensando na situação de alguns, deixando dúvida sobre se a escolha do personagem foi certa ou errada. Luiza Porfírio M.Ferreira, que mora em São Gotardo,MG, apresentou a crônica “À margem de mim”.
Esclareceu, em seu depoimento durante a reunião, que tem preferência para tratar de personagens idosos. E, no seu trabalho, cheio de frases muito bem elaboradas ( “A cidade mastigava seus próprios ruídos, cuspindo buzinas e passos apressados “), tratou de seu encontro com um desconhecido na praça da cidade, sentado num banco, tendo um jornal dobrado em mãos. Inquirido se fazia tempo que estava ali, responde: “
O suficiente para ver o dia começar e terminar sem que nada mude”. A crônica continua analisando a existência de um desconhecido, para quem a vida teria terminado. Manuela Del Lama Titoto, com sua crônica
“À Margem”, continua a eleger a nossa cidade , onde reside, como pano de fundo de seus trabalhos, que já são vários. Sua crônica foca três personagens: o frequentador diário da Praça Sete de Setembro, onde revive sua vida; o executivo que vive para cumprir seus compromissos e nem percebe os fios brancos refletidos no espelho do elevador e o mendigo sempre por perto do Pedro II, em busca de restos de comida. Para este, diz
“Na sua visão, o tempo é medido pelo movimento dos outros..” e arremata: “Assim, para ele, o tempo não é círculo, nem linha – é pausa, um momento estendido, feito água parada no rio que corre mais adiante “, manifestando a sua vida vazia e desinteressante.
Os novos talentos trouxeram alegria e orgulho para os membros da Academia, que veem o seu surgimento como manifestação de uma literatura moderna e viva.
* Advogado e empresário, é presidente do Conselho da Santa Emília Automóveis e Motos e secretário-geral da Academia Ribeirãopretana de Letras