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Curta documental de animação da brasileira Camila Kater está qualificado ao Oscar

Por Guilherme Sobota

Cinco mulheres narram em segmentos curtos de dois a três minutos episódios de suas experiências com o corpo feminino no curta documental brasileiro Carne – o filme, estreia de Camila Kater na direção, é uma coprodução Brasil/Espanha e estreou no Festival de Locarno em 2019, onde recebeu menção especial pelo júri jovem. De lá para cá, o curta foi selecionado em impressionantes 250 festivais e angariou mais de 70 prêmios, inclusive no mais recente Festival de Brasília.

Carne também está qualificado para o Oscar 2021 – ou seja, pode ser indicado pelos membros da Academia -, está na shortlist dos Prêmios Goya 2021 e teve seu lançamento online no New York Times Op-Docs (a plataforma gratuita de curtas do jornal americano), onde segue disponível.

O filme é um curta documentário animado em que cinco mulheres – Rachel Patrício (gordofobia na infância), Larissa Rahal (tabu da menstruação), Raquel Virgínia (da banda As Baías, sobre as violências sofridas pelo corpo da mulher na fase adulta), Valquiria Rosa (climatério) e a consagrada atriz Helena Ignez (a libertação do corpo na terceira idade) – compartilham relatos íntimos e pessoais em relação ao corpo, desde a infância até a terceira idade.

Cada segmento foi animado por uma artista diferente e com técnicas variadas. Na infância (cada capítulo é nomeado como um ponto de cozimento da carne, e a primeira é Crua), a diretora Camila Kater utiliza stop-motion com objetos e pintura a óleo em cerâmica; em Mal-Passada, o que narra é a animação em aquarela criada por Giovana Affonso. Na fase Ao Ponto, a animação digital 2D foi criada por Flávia Godoy. Cassandra Reis criou o stop-motion em argila de Passada, e Leila Monsegur ficou responsável pelas pinturas e pela intervenção em película 35 mm no capítulo final, Bem Passada.

O curta é financiado pela Spcine e Prefeitura de São Paulo, e começou a ser amadurecido no edital de 2016, conta a diretora, Camila Kater. “A escolha das personagens veio a partir da estrutura que escolhi previamente”, comenta sobre o processo de criação. “Existia a ideia da associação irônica com as fases do cozimento do carne, limitei isso para cinco fases e criei um perfil de personagem para cada fase, com perfil de idade e temática. A gente fez uma pesquisa bem aprofundada em relação aos temas, e possíveis mulheres que se encaixariam.”

Durante os 12 minutos do filme, essa associação entre consumo de carne – cujo combate vem ganhando cada vez mais tração na pauta ambientalista – e a percepção do corpo feminino como “objeto” de consumo pela sociedade fica clara. “Comecei a pensar no corpo feminino, com experiências pessoais e histórias da minha família, etc… Em 2016, com aquela hashtag #meuprimeiroassédio, o tema ficou borbulhando, com mulheres se abrindo e contando histórias em relação a abuso e em relação ao corpo. Durante o processo do filme, a gente tinha criado essa associação a partir de um livro chamado A Política Sexual da Carne, da Carol J. Adams, e ela faz essa comparação do corpo da mulher e do consumo da carne. É uma teoria feminista vegetariana.”

Além de Locarno, Carne passou por eventos como o Toronto International Film Festival, no Canadá, e o 44.º Annecy International Animation Film Festival, na França, bem como nos principais festivais brasileiros, Rio, Brasília e São Paulo (o Curta Kinoforum), angariando prêmios de melhor curta, roteiro e animação. Carne corre em paralelo com outra produção brasileira, Umbrella, de Helena Hilario e Mario Pece, que também está na briga pelo Oscar, em outra categoria, curta de animação (Carne concorre como curta documental).

“Eu tive sorte”, garante a diretora de Carne. “Consegui pegar alguns apoios da Ancine e do Itamaraty, enquanto isso ainda era possível. Fui para Locarno, Toronto, Egito, alguns festivais na Europa. Foi uma experiência incrível para mim, foi um sonho. Não fazia ideia do tamanho desses espaços para animação, foi muito emocionante ver a reação das pessoas. Mulheres vinham conversar comigo, foi muito especial. Eu acho que as pessoas, principalmente as mulheres, conseguem se conectar muito com o filme. Vem da potência das personagens, mas também do potencial que a animação dá ao filme. De você praticamente sentir pelas técnicas.”

A diretora já está desenvolvendo também um projeto de série com a mesma pegada. “Mesmo na animação independente, ainda faltam muitos filmes dirigidos por mulheres. O filme e a série vieram de uma demanda das pessoas por esse tipo de conteúdo. Tenho muito orgulho.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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