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O tempo e o agora

O elemento básico da informação é o sinal registrado nas palavras que, quase sempre, mas nem sem sempre, guarda um conceito universal. Até mesmo os denominados animais irracionais valem-se de sinais para comunicar suas mensagens, como, por exemplo, os cães que pela forma de seu latido transmitem sua simpatia ou sua antipatia.

Após a Primeira Guerra Mundial, o filósofo austríaco Wittgens­tein abandonou suas aulas na Inglaterra, passando a ministrar grupos de alunos primários em escolas então encontradas nas regiões mais atrasadas das Áustria. Afirma-se, sem prova concreta, que chegou a dizer que os alunos daquelas modestas primárias, faziam-lhe pergun­tas mais interessantes do que os universitários ingleses.

Foi feito o registro da seguinte questão formulada por um aluno do curso primário austríaco: por que nas olimpíadas há disputas que são jogos e outras que não são jogos? O futebol, o xadrez, o tênis são jogos. Ao contrário, salto em altura, corrida, natação não são jogos. Qual é a diferença?
Feita a reflexão, o grande filósofo encontrou a chave do mistério. Os esportes cujas regras são impostas pelos homens são jogos, como, por exemplo, o futebol; os esportes cujas regras são definidas pela natureza não são jogos, como, por exemplo, a natação.

Universalizando a visão, imediatamente surgiu uma nova ques­tão: o direito é composto por regras outorgadas pelos homens. Então o direito é um jogo? Sim. Grandes mestres modernos sustentam que o direito não se submete à lógica por isso que tem ele uma lógica própria criada pelo homem.

No último 7 de setembro a principal autoridade do Brasil, entre outras afirmações públicas proclamou que doravante não deveria mais obedecer às ordens editadas por um ministro do Supremo Tri­bunal Federal qualificado como “canalha”.

No dia seguinte, sem se desculpar, publicou documento afirman­do que o desprestígio contido ao Supremo Tribunal Federal e a seus ministros não eram resultantes da racionalidade, mas, sim da sua irracionalidade derivada da emoção em que se encontrava.

Indaga-se, fluindo o tempo de vinte e quatro horas após as acu­sações feitas, o sentido jurídico e normativo nelas contidos evapora­ram, desparecendo do mundo jurídico? Ou não?

Um homem que hoje se casa, pode amanhã pretender esvaziar o conteúdo de suas declarações para voltar ao estado de solteiro? Ou aquele que compra um quilo de carne tem o poder de, no dia seguinte, desfazer o contrato afirmando que tudo era fruto de sua extrema emoção?

No passado, em declarações públicas enquanto era deputado federal, o senhor presidente da República, dirigindo-se publicamente a uma cole­ga dissera-lhe que não a estuprava porque a considerava feia.

Agora, no palanque comemorativo do dia da independência da Pá­tria, investido nos poderes da mais importante autoridade da República, afirmou que deixaria de obedecer às ordens do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal Eleitoral, para no dia seguinte considerar as palavras desprovidas de valor jurídico por isso que estava mergulhado na insensatez irracional de sua irracional emoção. Sem pedir desculpa à Nação.

Se todos são iguais perante a lei, está na hora de se acolher o arre­pendimento matrimonial e descasar o pobre homem envolvido na ir­racionalidade de sua emoção ao se casar; como também desconstituir a compra e venda de certa porção de bife, daquele outro que movido pela violenta emoção confundiu carne de vaca com peito de frango, desde que seja possível afirmar que o direito brasileiro permite jogar na cesta do lixo a ordem editada pelo senhor presidente da República decretando a desobediência às decisões editadas no âmbito das Cor­tes Supremas ou por um ministro que reputa “canalha” ou por outro que entende ser desprovido de competência.

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