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O vírus do “mosquito” do pedal

Após baixar a “poeira” da pandemia, quando o ciclismo viu uma explosão de praticantes, muitos desistiram, mas outros seguem fiéis às pedaladas (Foto: Alfredo RIsk)

Por: Adalberto Luque

O comerciante Ricardo Dutra começou a pedalar efetivamente, em maio de 2021. Antes sua história com a “magrela” foi na infância e adolescência, quando morava com a família no Jardim São Luiz, zona Sul da cidade, e saia com os amigos para pequenos passeios e aventuras.

Em sua retomada, Dutra redescobriu o prazer em pedalar na terra. Passou a fazer trilhas em 2022 e não parou mais. Engajado em vários grupos, pedala centenas de quilômetros por semana.

Teve alguns “acidentes de percurso” em sua jornada. Em dezembro de 2022, sua bicicleta foi roubada. Apesar do alto custo (valia cerca de R$ 8 mil à época), comprou outra e se dedicou ainda mais aos pedais. Novo obstáculo surgiu em junho deste ano, quando teve a moto roubada.

Usava a moto para se locomover e abrir sua lanchonete, localizada em frente a um hospital da região central e investiu em uma nova bicicleta, desta vez elétrica. Apostou nela para sua mobilidade urbana, a princípio, mantendo a outra para as trilhas. Até que tudo mudou novamente.

“Em 5 de outubro de 2024, tive um infarto andando de bike às 07h30. Meus amigos tiveram que me socorrer, porque o Samu [Serviço de Atendimento Móvel de Urgência] não conseguiu me localizar, estava perto da subida do Castelinho, entre Ribeirão Preto e Cravinhos, mas na trilha de terra”, lembra.

Dutra teve bike e moto roubadas, infartou durante um pedal, mas não desistiu e voltou menos de dois meses após sair de UTI (Foto: Arquivo Pessoal)

Depois de três dias na Unidade de Terapia Intensiva e de ter colocado “alguns” stents (dispositivos utilizados para restaurar o fluxo sanguíneo de artérias obstruídas), recebeu alta e, no dia 19 de novembro, voltou aos pedais e para as trilhas.

Sofreu com o período sem pedais, mas agora quer retomar as grandes aventuras. “Um dos meus melhores passeios foi em Cássia dos Coqueiros na festa da padroeira, onde você sobe num mirante e avista três municípios do alto”, encerra.

Vida mais saudável

O ciclismo é mais do que uma atividade física praticada quando possível. É porta de entrada para um estilo de vida saudável, equilibrado e em comunhão com a natureza.

As jornadas sobre duas rodas proporcionam diversos benefícios, físicos e mentais. Por ser uma atividade de baixo impacto, é acessível a pessoas sedentárias.

Obviamente tais pessoas não devem se dedicar com maior intensidade, mas ir aos poucos se aprofundando e estendendo seus passeios. Com os devidos cuidados, pois pedalar na cidade traz riscos. Um deles é o físico.

Alves Filho, o Pat incentivou esposa, filhos e o sogro, que se curou de dores com a prática do ciclismo (Foto: Arquivo Pessoal)

Com um trânsito intenso, as chances de acidente aumentam se o ciclista não seguir regras de trânsito – válidas para ele também – e se não usar equipamentos de segurança, como o capacete. Outro risco são os roubos e furtos. As bicicletas usadas para o mountain bike (trilhas) ou speed (estradas) tem um alto custo. As mais simples custam a partir de R$ 2 mil, mas a média é de R$ 10 mil. E há bicicletas que custam mais de R$ 100 mil. Isso atraiu o interesse de criminosos.

Dito isso, é bom retomar um contato que, para muitos, vem da infância. Paulo Henrique Alves Filho, o Pat, sempre teve esse contato. A bicicleta foi seu brinquedo favorito. e, há cinco anos, depois de muito tempo sem pedalar, comprou uma nova bike.

A ideia era usar no trabalho, mas o trânsito não permitiu. Acabou usando nas trilhas, fazendo amizades e frequentando vários grupos de pedais. “Costumam dizer que o ‘mosquitinho’ do pedal me picou e não parei mais”, lembra.

Fez o Caminho da Fé três vezes (as duas últimas em apenas quatro dias), em seu principal ramal, entre as cidades de Águas da Prata e Aparecida, num trajeto superior a 350 quilômetros, com subidas que chegam a assustar o ciclista. Para onde viaja com a família, leva a bike ou aluga uma. Ele, sua esposa e os dois filhos fazem pedais juntos.

 

E o ‘vírus’ atingiu seu sogro. “Era caminhoneiro, sofreu um grave acidente, com lesão séria na coluna. Teve que parar. Convivia com dores constantes, só ficava em casa. Tomava remédio para dor. Uma vez levei a bicicleta do meu filho pra ele, uma de aro 26 e disse para tentar andar de bicicleta para ver se não melhorava. Resumindo, gostou tanto de andar, que hoje pedala mais que eu”, orgulha-se. As dores sumiram e ele pedala todos os dias.

Social

O professor universitário Evandro Ruiz sempre teve bicicleta. E foi adepto a aventuras, mesmo que isso lhe rendesse broncas e até surras dos pais. Nascido em Ribeirão Preto, morou alguns anos de sua infância em Sertãozinho. Uma vez foi com os amigos até uma usina de cana na região. Estava em uma Caloi Berlineta aro 20. Saíram logo cedo e voltaram no final da tarde. Os pais todos preocupados. “Apanhei muito dos meus pais”, diverte-se.

Em 2017, com uma bicicleta mais apropriada, começou a pedalar nos grupos que rodam a cidade e fez grandes amizades. Outro benefício da bike: a interação social.

Ruiz (à esquerda) e o amigo Dimi, na chegada a Bueno de Andrada, em Araraquara, em 24 de novembro, após pedalar durante a madrugada (Foto: Arquivo Pessoal)

Naquele mesmo ano fez pela primeira vez seu trajeto preferido: de Ribeirão Preto a Bueno de Andrada, distrito de Araraquara, famoso pela coxinha dourada. “Esse passeio é sempre uma festa. Neste final de semana (23 e 24/11), fiz pela quarta vez. A gente se reúne meia noite e sai para chegar lá e pegar a loja de coxinha abrindo pela manhã. Um pedal muito divertido”, revela.

O trajeto conta com carro de apoio e com um veículo à frente, iluminando o caminho para evitar riscos, como animais noturnos e máquinas colheitadeiras, que trabalham de forma automatizadas.

Ruiz também fez o Caminho da Fé, trajeto que vai refazer em abril de 2025. Outro passeio que gostou muito foi a Rota das Capelas, de Monte Alto, visitando 13 capelas, com percurso de 90 km.

“Pretendo fazer outras viagens, pedalar na Europa (porque existe uma infraestrutura muito grande para o ciclismo). Tem o EuroVela, estradas de mais de 7 mil km. Uma ciclovia com mais de 7 mil km. Para pedalar, a Europa é um excelente lugar. Tenho vontade de conhecer esses caminhos.”

Sair pelo mundo

Hoje aposentado, Carlos Antônio Barbosa estava em um bar, em 2010, quando ouviu falar sobre o Caminho da Fé pela primeira vez. Comprou uma bicicleta e começou a treinar. Sempre sozinho, em 2013 resolveu encarar o desafio. Com uma aro 26, saiu de Ribeirão Preto e rodou mais de 500 km em 10 dias até chegar à Basílica de Aparecida.

Barbosa já participou de vários grupos, mas também fez vários passeios solo, como na fronteira entre São Paulo e Paraná (Foto: Arquivo Pessoal)

Foi outras duas vezes, ambas com bicicletas mais apropriadas, aro 29. A última foi em maio de 2024, com os amigos Marcelão e Guto, desta vez, saindo de Águas da Prata. Com a pandemia, Barbosa viu crescer o número de praticantes e participou de vários grupos, fazendo amizades.

A pandemia passou e os grupos que chegavam a reunir até 100 participantes, foram acabando. Mas a paixão de Barbosa pelos pedais seguiu. Já fez duas vezes o trajeto entre Ribeirão Preto e Franca, foi a Jeriquara passando por Guará. Foi de Ribeirão Preto a Tambaú. “No feriado do dia 20 (Consciência Negra) fui de bicicleta até Cravinhos para conhecer um Outlet”, lembra.

Ao visitar a filha que mora em Ourinhos (SP), Barbosa levou sua bicicleta – que chama de Peregrina. Decidiu explorar outro estado. Já tendo passado de bike por vários pontos de São Paulo e Minas Gerais, entrou no Paraná. “Mas sempre sem correria, tranquilo”, finaliza.

Um dia vou fazer isso

Paulo Ferrari compete em provas amadoras de Mountain Bike há 17 anos. Sua paixão pela bike, todavia, começou ainda criança. “Sempre via a galera passar com roupas de trilha. Imaginava que um dia iria fazer isso”, revela.

Paulinho montou suas próprias bikes e tornou-se ciclista amador de competição e mecânico de bicicletas (Foto: Arquivo Pessoal)

Esse dia foi chegando. Para acompanhar o esporte, Paulinho, como é conhecido, passou a montar suas próprias bicicletas. Até chegar a uma bicicleta que lhe deu condições de competir. Aos 20 anos, entrou em uma equipe. Ficou por uns tempos e mudou para outra, onde está até hoje. Acredita que tenha participado de mais de 70 provas.

Para se dedicar ao ciclismo, tornou-se um conceituado mecânico de bikes. Tem uma oficina nos fundos da casa e divide seu tempo entre os treinamentos e as manutenções nas bicicletas de clientes – inclusive deste repórter.

Quando não está competindo ou trabalhando nas bikes, Paulinho segue sobre duas rodas. “Sempre que dá, vou dar umas voltas com meus sobrinhos, sentir o vento no rosto, sem a adrenalina de competir. Bicicleta é isso”, conclui.

Crescimento das ciclovias

Ribeirão Preto viu crescer, nos últimos anos, o número de ciclovias, pistas exclusivas para ciclistas – embora muitos pedestres insistam em não respeitar esse espaço. De acordo com a Prefeitura de Ribeirão Preto, a cidade conta com 62,3 quilômetros de ciclovias, a maior parte instalada nas duas gestões do prefeito Antônio Duarte Nogueira, entre 2017 e 2024.

Os principais corredores para ciclistas são a Avenida do Café, Via Norte, Avenida Maurílio Biagi, Avenida Luzitana e Avenida Thomaz Alberto Whately. A cidade conta com 8,55 km para cada 100 mil habitantes. Pouco, se comparado com a média nacional das capitais.

A esposa e o sogro de Pat: unidos pelo pedal (Foto: Arquivo Pessoal)

De acordo com a Associação Brasileira do Setor de Bicicletas (Aliança Bike), 11,09 km por grupo de 100 mil habitantes é a média das capitais brasileiras. Porém Ribeirão Preto tem um trunfo.

“O município se destaca pelo fato de ser um dos únicos do Brasil que atualmente está em processo de elaboração de um Plano Cicloviário, através do Departamento de Mobilidade Urbana (Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento Urbano)”, explica a Prefeitura.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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