Tribuna Ribeirão
Geral

Um rio agoniza em meio à lama

LUCAS HALLEL-ASCOM-FUNAI

O número de mortes em decorrên­cia do rompimento da barragem da Mina Córrego de Feijão, em Brumadinho, na região metropoli­tana de Belo Horizonte, já chegou a 166, segundo dados atualizados divulgados pela Defesa Civil de Minas Gerais. Do total, 160 corpos foram identificados. Ainda não há informações sobre seis mortos. As buscas seguem na cidade desde o rompimento da barragem da mine­radora Vale, em 25 de janeiro. Os rejeitos invadiram áreas da Mina do Córrego do Feijão, onde a estrutura estava, e das proximida­des, deixando um rastro de mortes e destruição. De acordo com o balanço da Defesa Civil, ainda há 155 desaparecidos. Destes, 37 são classificados como integrantes da “lista da Vale”, por serem da equipe da mineradora, e outros 118 são designados como não localizados da comunidade, grupo que engloba moradores, trabalhadores que atua­vam na área atingida e turistas. Desde o início das buscas, foram localizadas 393 pessoas, das quais 224 da “lista da Vale” e 169 da comunidade. Não há mais hospitalizados, conforme o balanço atualizado pela Defesa Civil. As investigações sobre o rompimento da barragem da Vale em Bruma­dinho caminham para que, ao seu fim, seja apresentada denúncia por homicídio.

Somente ao término do trabalho da força-tarefa que apura a tragédia, porém, será possível saber se culposo ou doloso, e a quem será imputado o crime. “Para mim, o homicídio está muito claro”, afirma o promotor André Sperling, que responde pela Coor­denação de Inclusão e Mobilização Social (Cimos) do Ministério Público de Minas Gerais, e participa da força-tarefa que apura o rompi­mento da estrutura. A Vale já sabia, desde outubro do ano passado, que a barragem I de Brumadinho e outras nove estruturas em Minas Gerais estavam enquadradas em uma categoria de atenção. Essa informação consta de um docu­mento da própria empresa sobre a situação dos reservatórios que a Justiça tornou público. Os dados foram obtidos pelo MP, que moveu ação contra a mineradora. O presidente da Vale, Fábio Sch­vartsman, negou que a companhia soubesse previamente dos riscos do rompimento da barragem do Córrego do Feijão. O executivo disse que os relatórios foram feitos pela própria empresa, em atendimento a normas da Agência Nacional de Mineração (ANM). “Gostaria de explicar que existe a obrigação legal de calcularmos para a ANM o im­pacto de uma eventual falência das minas no número de vítimas. Isso é lei. Isso em absoluto significa que a Vale sabia que algo ia acontecer a ponto de saber o número de mor­tos”, afirmou, em audiência pública na Câmara dos Deputados. Ao menos 305 quilômetros do Rio Paraopeba foram contamina­dos pelos rejeitos liberados com o rompimento da barragem. O levantamento foi realizado durante uma expedição da Fundação SOS Mata Atlântica na região, em que foi avaliada a qualidade da água em 22 pontos do rio. Com duração de de dias, a força-tarefa terminou no último sábado (9). A equipe percor­reu mais de dois mil quilômetros de rodovias e estradas próximas ao leito do rio, de Brumadinho até Feli­xlândia, também em Minas Gerais. A fundação classifica o resultado como “estarrecedor”. Nos 305 quilômetros analisados, a água estava com qualidade péssima ou ruim. No último ponto, no reservatório de Retiro Baixo, a turbidez era três vezes maior do que o permitido pela legislação. Esse índice é um dos fatores que indica se o rejeito está impedindo a incidência de luz na água. Ao todo, o Paraopeba tem 546,5 quilôme­tros de extensão, abrangendo 48 municípios mineiros. A contami­nação impacta especialmente as comunidades locais, onde vivem ribeirinhos, quilombolas, indígenas e agricultores, que utilizavam a água para subsistência, atividades econômicas e lazer.

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