Conceição Lima *
O PAPA FRANCISCO alimenta, de fato, essa esperança. Em fevereiro passado, ele enviou uma mensagem à Cúpula de Ação sobre Inteligência Artificial, que se se encerrou em 11 de fevereiro de 2025, em Paris. Nela, o pontífice manifesta a expectativa de que seja criada uma plataforma, na qual a IA possa ser um instrumento para combater a pobreza, a proteção das culturas e a ecossustentabilidade do planeta: “Espero que as próximas cúpulas considerem mais profundamente os efeitos sociais da Inteligência Artificial nas relações humanas, na informação e na educação”, escreve o Papa.
O seu antecessor, WOJTYLA, também já manifestava essa mesma preocupação de “dar voz aos que não têm voz”: “A questão fundamental é, e continuará sendo, humana, isto é, se, no meio destes progressos tecnológicos, o homem, enquanto homem, está se tornando realmente melhor, ou seja, mais maduro espiritualmente, mais consciente da dignidade da sua humanidade, mais responsável, mais aberto aos outros, especialmente aos mais necessitados e aos mais frágeis.” (JOÃO PAULO II, Carta EncíclicaRedemptorHominis).
Não há dúvidas de que toda a tecnologia é construída no pressuposto de que irá melhorar, facilitar a vida humana. Quanto a isso, com certeza a Inteligência Artificial será realmente o instrumento mais poderoso de que se tem notícia. Poderá arcar com a quase totalidade das tarefas penosas, pesadas, cansativas, repetitivas, monótonas desempenhadas pelo ser humano. E de uma maneira exponencialmente mais eficaz, dada a rapidez e a memória dessas máquinas, aliás, diuturnamente aperfeiçoadas.
Porém, o coração do homem, que o PAPA FRANCISCO busca atingir na essência de sua mensagem, esse não me parece que vá ser tocado por qualquer tecnologia, por mais avançada que seja. Não! O homem não se tornará essencialmente melhor pela ação exclusiva da Inteligência Artificial. Também não creio que esteja se tornando pior, como alguns querem fazer crer. A questão é bem outra! E, quem sabe, possa agora vir à tona de modo bem mais contundente.
Num artigo anterior, numa tentativa de explicar a tendência de a IA estar se comportando de modo tão trapaceiro quanto os seus criadores humanos, o filósofo MARCUS ARVAN deixou bem claro que elas nada mais são do que o produto de uma sociedade desleal e egocêntrica. Dessa maneira, não penso que as máquinas vão melhorar os homens, muito pelo contrário! Somente quando os povos da Terra passarem se comportar de modo ético, sem exceção, é que conseguirão produzir dados também éticos, exatamente aqueles usados para treinar as IAs. Não há outra saída, penso eu.
O advento da era da Inteligência Artificial Generativa, aliás, vai colocar o homem num dilema existencial sem precedentes. As máquinas irão executar a maioria das tarefas em que os homens têm se empenhado até o momento. E, ao homem, então, o que restará fazer? Aqui é que se encaixa o cerne da questão. Até o presente momento histórico, parece que a raça humana só se tem dado conta de seus valores intelectuais. Todos os esforços de melhoria estão focados nessa dimensão: mais saber, mas eficiência produtiva, mais riqueza… Ora, o ser humano não é somente isso! E as dimensões emocionais e espirituais, onde ficam ?Onde se situam também certas habilidades cognitivas visivelmente relegadas, como a criatividade, a liderança, a colaboração, a convivência pacífica?
Do meu ponto de vista, somente uma instituição pode dar conta desse recado: A ESCOLA. Pode parecer uma solução muito simplista…Mas, se a educação não o fizer, ninguém mais tem o poder de fazê-lo. Haja vista os crimes, os conflitos, as guerras, a fome e todas as mazelas sociais que vêm se perpetuando desde a Idade da Pedra. Todavia, até mesmo as melhores instituições educacionais têm relegado propositadamente esses aspectos. Somente as de saúde mental, as religiões e os movimentos esotéricos é que têm se preocupado com os aspectos emocionais e espirituais do ser humano, sem muito sucesso, diga-se de passagem, porque buscam remediar e não prevenir e não congregam ou seduzem a totalidade dos indivíduos.
Também acho muito difícil que a escola consiga fazer isso, se continuar pensando e atuando exatamente como vem fazendo desde há muitos séculos passados. Seria mesmo necessária uma mudança radical, que o atual sistema e as atuais políticas públicas nem sequer conseguem ainda imaginar. Também não adianta culpar as máquinas pelos problemas atuais ou futuros. Elas continuarão aí, cada vez mais intelectualmente sofisticadas e podem mesmo ultrapassar e dominar os homens nesse aspecto, aliás, da mesma forma que os seus criadores humanos sempre buscaram fazer entre si. Porque elas tendem a se tornar mais poderosas intelectualmente do que os seus “pais”, mas continuarão emocional, ética e espiritualmente tão burras quanto eles. Então, tudo vai mesmo depender é de nós mesmos!
* Professora de ensino superior aposentada, escritora e palestrante, é membro eleito da Academia Ribeirãopretana de Letras e fundadora da Academia Feminina Sul-Mineira de Letras