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Meu Reino é deste mundo: a opção política dos evangélicos (Parte I)

Tenho falado en passant sobre este tema em alguns dos meus artigos aqui no Tribuna. Mas hoje e no próximo sábado, eu gostaria de focar em especial esta questão. Até porque, no meu doutorado em Ciências da Religião, que conclui em 2015 na Universidade Metodis­ta de São Paulo, o fator evangélico no contexto dos “novos movi­mentos religiosos” (NMR) estava sempre presente.

Lembro-me bem que o crescimento numérico dos evangélicos e suas razões eram e continuam sendo temas recorrentes nos encon­tros da ABHR (Associação Brasileira da História das Religiões) e da SOTER (Sociedade de Teologia e Ciência das Religiões) de que eu participava com todo interesse. Mais recentemente, o meu trabalho de conclusão de um curso de especialização em Ciência Política, também abordei diretamente esta questão. Seu título foi “A atuação das bancadas evangélicas nas casas legislativas frente a previsão de um Estado Laico no Brasil”.

No artigo de hoje, vamos abordar algumas preliminares neces­sárias. Quero esclarecer que o mundo evangélico é bastante hete­rogêneo, contrariando certa propaganda que suas lideranças mais conservadoras gostam de fazer. Há muitas diferenças entre as suas denominações no que se relaciona principalmente a visões teológi­cas, estratégias pastorais e usos e costumes. Ressalto aqui inclusive a imprecisão conceitual do termo “evangélico”.

Na sociologia das religiões, já se convencionou distinguir os “evangélicos” dos “protestantes”. Os primeiros englobam os pente­costais (três ondas no Brasil), com destaque para a Assembleia de Deus e a Congregação Cristã do Brasil (primeira onda), que foram as primeiras a se organizarem no Brasil no início do século XX. Os protestantes se referem àquelas denominações mais diretamente li­gadas ao movimento da Reforma no século XVI, como os luteranos, presbiterianos, anglicanos e com alguma influência também sobre outras como metodistas e batistas.

Já os neopentecostais (terceira onda), que se desenvolveram no Brasil a partir dos anos 80, englobam a Igreja Universal do Reino de Deus (Bispo Macedo), a Internacional da Graça de Deus (JR Soares), a Renascer em Cristo (Estevam Hernandes e Sônia Hernandes), Mundial do Poder de Deus (Valdemiro Santiago) e a Sara Nossa Terra (Robson Rodovalho). Estes radicalizaram muitos aspectos da visão evangélica, se assim podemos dizer, estimulando certas doutri­nas como a teologia da prosperidade que afirma que ser abençoado por deus é o mesmo que se dar bem na vida em termos materiais.

Outra característica são os cultos para cura e libertação, em uma luta constante contra as religiões de matriz africana, consideradas por eles como religiões comandadas por demônios. Em sua maioria, os neopentecostais não possuem nenhum escopo teológico bem definido e são avessos aos estudos acadêmicos de Teologia.

Dentre as características comuns dos Pentecostais e Neopente­costais, duas merecem destaque: a primeira é a grande ênfase que dão à literalidade do texto bíblico para assegurar a fidelidade àquilo que entendem ser a vontade de Deus. Ainda que alguns pastores tentem trazer aos fiéis possíveis aplicações dos textos bíblicos, a sua literalidade é vista como fato e não como interpretação. É por aí que se justifica muitas vezes o fundamentalismo de sua visão religiosa.

Assim, textos como os relatos da criação no Gênesis, da arca de Noé, da torre de Babel e vários outros são trazidos como fatos escritos sob a revelação divina de como as coisas ocorreram, sem ne­nhum tipo de interpretação. Se afastam, por isso mesmo, de estudos bíblicos de caráter mais científico. Outra característica é uma visão meio mística a respeito da ação do Espírito Santo que acaba cercada de um sincretismo religioso sem tamanho, de maneira que, em uma mesma congregação, é possível ver elementos tirados de diversos lu­gares, tais como o judaísmo e de religiões tidas por eles como pagãs. Continuamos no próximo sábado.

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