Amaury Fraga *
O tarifaço imposto pelo governo dos EUA aos principais países do mundo (medida única, é certo, num período histórico de 21 séculos) continua na sua surpreendente trajetória, embora a suspensão momentânea das surpreendentes taxas.
Tarifas que se entrechocam e atingem veementemente todo um ciclo econômico – político – filosófico – social esboçado e seguido nestes últimos 80 anos, ou seja, a partir do termo da II Grande Guerra, em 1945.
Tal sistema fora delineado por especialistas tidos como admiravelmente capazes e representantes das mais importantes nações. Utilizaram-se de meios inovadores e eficientes, como o Plano Marshall (criado em 1948 e aplicado apenas na Europa), a Organização Mundial do Comércio (OMC, criada em 1947 como GATT – Acordo Geral de Tarifas e Comércio, sendo o mais eficiente fomentador das trocas internacionais.
O Fundo Monetário Internacional (FMI viabilizado em 1944), o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD 1944), o Banco Mundial, a Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico, (OECE, 1948, rebatizada como OCDE em 1961), todos de certa forma, ligados ao mais importante entre aqueles empreendimentos, a Organização de Nações Unidas (ONU, estabelecida em 1945).
Todo este modelar, excepcional modelo teria sido instituído para prevalecer (e prevalecia) até o final dos tempos. Até que, surpreendentemente, os EUA lançam mão do Tarifaço. Porque? E como ficará a ONU, após e em sequência ao tarifaço? Alguns especialistas em política internacional acreditam que a mesma motivação que ameaça o comércio mundial poderá instituir meios que ameacem a existência da ONU.
Estes mesmos especialistas acreditam também que o governo norte – americano possa ter adotado tal comportamento levado, conduzido por estratégias especiais praticadas pela China. Estratégias que levam os EUA a indisporem-se inclusive, com a Europa. Ora, as origens básicas dos Estados Unidos da América do Norte, seu povoamento mesmo, são sobretudo europeus. A Europa constituiu-se sempre no seu mais importante aliado, a partir de certo momento histórico. E, como indispor-se então, através do tal tarifaço, com seu mais destacado aliado? E como lidar com o alarmante vazio que poderá resultar a partir daí? Com a nova realidade que poderá surgir?
E esta indisposição, esta motivação agressiva não se dá somente com seus parceiros, como Japão, europeus, México, Canadá, etc, etc.), mas com importantes entidades locais (universidades) e até com a própria imprensa.
Há ainda a agressiva (e inconsequente) nova política comercial para com o Canadá, ao Norte, o México, ao Sul, seus vizinhos mais próximos. Causa então veemente estranheza aos especialistas, esta condenável e perigosa atitude, em razão da efetiva contiguidade dos três territórios.
Num outro aspecto, esta veemente agressividade com a União Europeia (mais Japão e outros países) não seria em reação ao sempre crescente relacionamento comercial deste bloco com a China? E o seu papel como mediador especial para celebração da paz entre Ucrânia e Rússia? Numa interferência direta e inusitada na política externa russa e chinesa. A parceria toda especial e acalentada da China e Rússia data desde as primeiras décadas dos anos 1900 (1920 em diante) iniciada com a então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, URSS, desaparecida em 1991. Desde Mao Tsé-Tung (Mao Zedong), um dos criadores do Partido Comunista Chinês, 1921 e fundador da República Popular da China.
Esta “missão para a paz” norte-americana seria então como uma “cunha” implacável, metida destruidoramente ao meio do relacionamento prodigioso e soberbamente cultuado entre China e Rússia (URSS). As taxas de importação impostas à China ultrapassam 200%. Se tudo então se resume num conflito implacável entre EUA e China, porque não resolver tal “parada” como sempre se procedeu nos tempos idos? Porque agora é tudo bem diferente. Há a bomba H, e o seu uso mútuo resultaria no mais horrendo e generalizado caos. Caos! E, a partir desta insofismável verdade, utilizam-se, os dois contendores dos milenares ensinamentos do filosofo-estrategista-militar chinês, o general Sun Tzu? Admirado e cultuado reverentemente através dos séculos. É bem provável…
“Conquiste tudo sem lutar”, “Atinja o objetivo sem destruí-lo”, “Conquiste tudo sob o céu, mas deixando intato o alvo de sua ambição”. Como: “Modele o inimigo (conduza-o segundo seus propósitos)”, “Vença a guerra da informação”, “Exerça a liderança baseada no caráter”, “Dissimulação e previsão”, “Tenha um bom serviço de informação e contra-informação (espionagem)”. E se o sábio convivesse com uma realidade semelhante à atual, aconselharia: “Valorize ao máximo a mídia mundial…”
E foi, num outro imbróglio semelhante, a Guerra Fria que com um discurso soberbamente ensaiado e conforme com os inconfessados objetivos de vitória, conquista e domínio que a grande Nação do Norte da América cultuou e valorizou ao máximo a mídia mundial, modelou o inimigo, venceu a guerra da informação (e isto foi decisivo), teve dissimulação e previsão, conquistou tudo sem lutar e sem dar um tiro sequer, e fez enfim, esboroar a emblemática terrível e invencível União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, URSS, em 26 de dezembro de 1991. A URSS foi constituída em 1922, tinha 22,4 milhões de quilômetros quadrados, era constituída de 15 repúblicas, nove países a seu domínio, e 282 milhões de habitantes. O segundo maior PIB do mundo na década de 1970, como a China tem hoje.
(Mark McNeilly – Sun Tzu e a arte da Guerra Moderna, Oxford University Press, Inc, 2002; James Clavell – The art of War by Sun Tzu, NY: Delacarte Press, 1983, 16; Lidell Hart, “As grandes guerras da história”.
* Jornalista, trabalhou no “Estado de Minas”, rádio, televisão (TV Manchete, chefe de reportagem e editor), Revistas Bloch (“Manchete”, “Fatos e Fotos”) e “Jornal do Brasil”