No início do uso da informática, utilizava-se muito o termo cibernética, derivado do grego kubernētikḗ, que significa pilotar, encaminhar. O termo foi cunhado pelo matemático estadunidense Norbert Wiener em 1948 e basicamente descreve como um sistema pode encaminhar decisões a partir de informações inerentes ao seu funcionamento, levando assim ao equilíbrio do sistema por autocontrole. Segundo ele, tais decisões são tomadas pelos seres vivos e também por máquinas, desde que essas sejam alimentadas pelas informações necessárias. É o básico da informática.
Quando se fala em inteligência artificial, estamos tratando de sistemas que podem tomar milhões de decisões em uma fração de segundos. No início de seu desenvolvimento, utilizar a Teoria dos Jogos foi a estratégia escolhida pelos desenvolvedores da Inteligência Artificial e do aprendizado profundo de máquina. Isso é plausível quando olhamos para os relacionamentos econômicos, políticos e sociais da Humanidade. Tudo, na verdade, é um cenário em que se pode simular um jogo, seja uma negociação empresarial, uma votação na Câmara Federal ou mesmo uma discussão sobre o relacionamento de um casal. Tudo envolve captação e análise de dados para a tomada de decisões. Compraremos ou não aquela empresa que foi oferecida para a nossa? Vamos lucrar com isso ou é uma compra arriscada demais? Meu partido e minha região ganharão alguma coisa se eu votar com o governo nessa matéria ou será um erro político da minha parte votar assim? Devo me separar agora ou posso tentar mais um pouco? Será que o que me falaram dele é mesmo verdade ou é intriga?
Normalmente são situações que exigem decisões em curto espaço de tempo e que dependem de uma análise rápida das informações que se tem naquele momento. Assim também é com cenários de guerra, onde as decisões estratégicas têm que ser adotadas e repassadas hierarquicamente de forma rápida, compreensível e com execução imediata. A tendência atual é de ampliação do uso de sistemas de IA pelas forças armadas de nações em situação de conflito, num ritmo fora do recomendado como prudente.
Atualmente a IA é aplicada em sistemas de apoio como logística, organização e reposicionamento de tropas, análise de cenários táticos, sistemas de identificação de alvos e direcionamento de tiro. De longe, a captação, seleção, análise e produção de informações são as formas mais utilizadas em um conflito armado no século XXI. Como eu já disse, conhecer bem o inimigo é a chave para a vitória.
Produzir informação, captando dados sobre o adversário por meio de diferentes meios materiais e eletrônicos, analisá-los, estruturá-los e a partir disso criar cenários possíveis, é o primeiro uso da IA numa guerra. O segundo é a produção de contra-informação via meios eletrônicos, para confundir a captação e a troca de dados do inimigo, tanto em suas comunicações como em seus meios de ataque e defesa. Já o terceiro é a desinformação com a divulgação de informações erradas, criando despistes e engodos e difundindo notícias falsas entre as fileiras inimigas e os habitantes do país adversário. A arma mais eficiente da IA militar é o hacking, que consiste na invasão dos sistemas de IA do adversário e de suas redes. Com essa arma pode-se infiltrar vírus para destruir os sistemas de defesa eletrônica do inimigo, sabotar sua economia, provocar o colapso na distribuição de energia e obliterar os serviços de atendimento público, provocando assim o caos entre a população.
A grande preocupação com o uso da IA por forças armadas é com o fato de se delegar cada vez mais poder a esses sistemas inteligentes. O nível aceitável para essa delegação vai apenas até o de “aconselhamento”, para analisar dados e indicar possíveis ações a serem tomadas em cenários táticos diferentes. Entregar poder decisório a ela pode ser o início de um grande problema. Como determinar até que ponto a IA poderia ir no caso de controlar sozinha um ataque ao inimigo que poderia variar de intensidade de um momento para outro? Como ela poderia interpretar um pedido de rendição do adversário? Como um pedido verdadeiro ou como uma tentativa de enganá-la e, assim, sujeita à retaliação? Quais seriam as condições específicas para a IA determinar um recuo das próprias tropas, salvaguardando ao máximo a integridade física delas? Ao nível estratégico, até que ponto de escalonamento de ataque ou revide, estaria ela autorizada a assumir o controle dos armamentos e tropas? Quais tipos de armamentos seriam? Uma falha nesse autocontrole da IA poderia resultar em uma derrota ou um novo holocausto. Sem diretivas realmente eficazes de controle é muito arriscada qualquer tentativa de passar o controle, mesmo que mínimo, para a IA.
Lembre-se que a IA baseia-se no princípio de aprendizado profundo, ou seja, em pouco tempo ela colocaria no chinelo todo o conhecimento militar do ser humano e, teoricamente, poderia assumir que assim sendo, militares e humanos não seriam mais necessários para se lutar uma guerra. Seriam apenas empecilhos descartáveis na Nova Guerra. Enfim o que para nós é uma guerra, para a IA seria apenas um jogo. Sem empate ou armísticio.
Semana que vem tem mais, dessa vez abordando a palavra da moda na comunidade IA: Extinção. Até lá.