Por: Adalberto Luque
Manhã de 22 de março. O médico ortopedista Luiz Antônio Garnica, de 38 anos, telefona para a Guarda Civil Metropolitana (GCM) e para o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU). Informa que chegou ao apartamento onde mora e encontrou a esposa sem vida, no chão do banheiro.
Os dois moravam num apartamento à rua Ignácio Ferreira, Jardim Botânico, zona Sul de Ribeirão Preto. De acordo com o primeiro boletim de ocorrência registrado, Garnica teria colocado o corpo da esposa na cama e iniciado massagens cardíacas.
A professora Larissa Talle Leôncio Rodrigues, de 37 anos, com quem Garnica era casado há 18, não reagiu aos estímulos. Os socorristas do SAMU apenas constataram que a mulher já estava morta.
A mãe do médico, Elizabete Eugênio Arrabaça Garnica, de 67 anos, também estava no apartamento, de acordo com a GCM. Um guarda civil municipal prestou depoimento e disse que estranhou o comportamento de Garnica no dia da morte de Larissa. Segundo o agente de segurança, o marido e a sogra da professora tentaram limpar o quarto do apartamento.
O médico ainda teria pedido para tomar banho antes de conversar com os policiais e sua mãe teria sugerido que ele trocasse de roupa. O marido também teria dito que pretendia cremar o corpo da esposa.
Testemunhas
Registrado como morte suspeita, a Polícia Civil ouviu várias testemunhas, inclusive Garnica e sua mãe Elizabete. O laudo da necropsia feita pelo Instituto Médico Legal (IML) e do exame toxicológico ainda não estavam prontos, mas a Delegacia de Homicídios da Divisão Especializada de Investigações Criminais (DEIC) já suspeitava do marido e sogra da vítima.
O delegado Fernando Bravo solicitou mandado de busca e apreensão, atendido pela Justiça, e recolheu celulares e notebooks do médico e sua mãe para serem periciados. O depoimento das testemunhas fez com que a polícia suspeitasse ter havido homicídio.
Uma das testemunhas ouvidas foi uma mulher que afirmou ter relacionamento com Garnica há um ano e meio. Ela contou que foi com o ortopedista ao cinema, em um shopping center da cidade, na noite que antecedeu a morte de Larissa. Foram fotografados juntos por amigos da professora. A mulher disse que, depois do cinema, foram para seu apartamento e passaram a noite lá.
No depoimento, afirma que o médico saiu por volta de 09h00 e foi para o apartamento onde morava, encontrando a esposa morta. Ligou por volta de 10h30, informando o ocorrido. Para Bravo, isso seria um álibi muito perfeito, o que fez com que a mulher também tivesse seu celular e notebook apreendidos durante as investigações.
Amigos de Larissa disseram que ela vinha passando mal, com vômitos, diarreia e tonturas. Coincidentemente, sempre sentia os sintomas após a visita da sogra, que lhe levava sopa. Que teria ido ao apartamento na noite que antecedeu sua morte.
Larissa, segundo relatos de testemunhas, sabia do caso amoroso do marido e havia encontrado brinquedos sexuais no carro dele. E pensava em se divorciar.
Testemunha chave
Uma amiga de Elizabete foi quem passou informações que levaram os policiais civis a acreditarem na culpa do médico e sua mãe. Ela disse que tempos antes da morte da professora, foi procurada pela mãe do médico, pedindo informações sobre como comprar chumbinho, para ajudar uma amiga.
A testemunha disse não saber onde encontrar o produto. Com o laudo toxicológico que apontou envenenamento por chumbinho em mãos, o delegado pediu a prisão preventiva de Elizabete e seu filho. Os dois foram presos na terça-feira (6). Ambos negaram terem cometido o crime.
Exumação
O depoimento da testemunha despertou outra suspeita da Polícia Civil. Ela disse que a amiga Elizabete teria dito, em tom de brincadeira, que a filha Natália Garnica, de 42 anos, dava muito trabalho, se metia em problemas. Disse que iria resolver isso antes de morrer para não carregar esse carma. Ficou sabendo da morte da amiga da filha por redes sociais.
Natália morreu em fevereiro, pouco mais de um mês antes da morte da cunhada. A irmã de Garnica também era saudável, teve morte suspeita e a mãe chamou um médico para tentar reanimá-la.
“São casos parecidos. A forma foi semelhante; a mãe do médico foi até lá, fez massagem cardíaca, foi muito semelhante, porém não podemos falar que foi envenenamento. Só uma análise técnica para esclarecer”, revelou o delegado que vai pedir a exumação do corpo para novos exames que possam comprovar se houve envenenamento.
Moda macabra
O envenenamento tem sido a ‘arma da moda’ para pessoas acima de qualquer suspeita extravasarem ressentimentos e se livrarem de desafetos. Os crimes têm sido mais frequentes a partir de um caso registrado em Torres (RS) no dia 23 de dezembro de 2024.
Três pessoas morreram e outras duas ficaram internadas, incluindo a principal suspeita, Deise Moura dos Anjos, após comer um bolo com arsênio. Deise seria desafeta da nora Zeli dos Anjos, que foi quem preparou o bolo.
A Polícia Civil gaúcha comprovou que ela havia pesquisado na internet os termos “arsênio veneno”, “arsênico veneno”, “veneno que mata humano”, “veneno para coração” e “veneno para humanos”. O arsênico – muito usado em pesticidas – foi encontrado na farinha do bolo.
Deise foi acusada de ter envenenado o bolo, além da suspeita de ter envenenado o sogro com arsênio. O homem morreu em setembro, a princípio por consumir leite em pó contaminado. Deixe foi presa em 5 de janeiro deste ano. No dia 13 de fevereiro, foi encontrada morta na cela em que ocupava sozinha.
“A Polícia Penal informa que, durante a conferência matinal na Penitenciária Estadual Feminina de Guaíba, a presa Deise Moura dos Anjos foi encontrada sem sinais vitais.”, limitou-se a informar a Polícia Penal do RS.
Baião de dois
No dia 1º de janeiro deste ano, nove pessoas de uma mesma família foram envenenadas após comerem um baião de dois no almoço, em Parnaíba (PI). Cinco morreram. O laudo do IML apontou presença do veneno terbufós.
No decorrer das investigações, Francisco de Assis Pereira da Costa, de 53 anos, que era casado com Maria dos Aflitos, foi preso. Ele negou o crime, embora tenha admitido ter ódio dos enteados.
A esposa de Francisco, Maria dos Aflitos, foi presa em 31 de janeiro. Ela confessou ter envenenado sua vizinha Maria Jocilene da Silva, com café envenenado, para proteger o marido e desviar o foco das investigações. A Polícia Civil do Piauí segue investigando o caso.
Ovo de Páscoa
Um menino de 7 anos e sua irmã, uma adolescente de 13, morreram após comerem um ovo de páscoa envenenado em Imperatriz (MA). A criança morreu no dia 17 de abril e a adolescente no dia 22. De acordo com as investigações, os irmãos foram mortos por um crime motivado por ciúmes e desejo de vingança.
A principal suspeita, presa no dia 1º de maio, é a esteticista Jordélia Pereira Barbosa, de 35 anos. A causa seria o relacionamento entre seu ex-marido Antônio Alves Barbosa Filho, e a mãe das crianças, Mirian Lira – que também foi internada por intoxicação, mas se recuperou.
Apesar de negar o crime, Jordélia foi presa após o avanço das investigações. Câmeras de segurança de uma loja registraram a suspeita comprando o ovo de Páscoa. E um mototaxista confirmou que foi a esteticista quem o contratou para entregar o ovo. O laudo feito nos corpos das vítimas apontou envenenamento por chumbinho, a mesma substância usada na morte de Larissa, em Ribeirão Preto.
Investigações
Tanto no caso do bolo envenenado, quanto nos do baião de dois e ovo de Páscoa, os envolvidos negam ter cometido o crime. Suas defesas reforçam essa afirmação. A única ré confessa é Maria dos Aflitos, no caso do baião de dois, que disse ter matado a vizinha envenenada depois de quase um mês do envenenamento de sua família para preservar o marido apontado como autor do crime.
Em Ribeirão Preto, as defesas de Elizabete e Garnica também sustentam que ambos são inocentes e vão provar isso. Também pretendem obter liberdade de seus clientes o mais rápido possível. O advogado que representa a família de Larissa não quis se pronunciar em respeito à família. O pai de Larissa ficou viúvo no final de 2024 e, pouco tempo depois, recebeu a notícia da morte da filha.
Venda clandestina
A Secretaria de Saúde do Paraná informa que o chumbinho, utilizado ilegalmente como raticida no País é um produto clandestino, sem composição definida. “Há grande dificuldade na adoção de procedimentos clínicos específicos no atendimento das urgências e emergências causadas pela ingestão de chumbinho, agravando ainda mais a situação”, informa.
No Paraná, entre 2017 e 2021 (dados preliminares), foram notificados 521 casos de intoxicação. Destes, 13 morreram em consequência do veneno.